Há quem alardeie que não precisa da ajuda de ninguém para viver bem e em paz.
Como posso concordar com isso se sou dependente, por inteiro, de tantas mãos a meu lado?
Nada somos sem o outro!
Derramei um pedido de ajuda telefônica a cinco amigos. Foi numa manhã chuvosa, em pleno feriado.
De noitinha, um amigo tinha providenciado o número do celular de que necessitava. Foi o bastante: resolvi o que me afligia.
No outro dia pela manhã, recebi resposta de mais um. Como já tinha encaminhado a solução, agradeci a ele.
E os demais? Ah, estes não me deram retorno! Veio-me à mente Jesus: tendo curado dez leprosos, só um voltou para agradecer.
Onde os outros nove?
De minha parte, alegrou-me saber do empenho de um em me ajudar rapidamente. E do outro, que logo me socorreu.
Mas não nego que fiquei decepcionado com a ausência das respostas de amigos bem próximos.
Algo tamborila em minha cabeça: desconfio que tenho pouco tempo por aqui.
Naquilo que me foi possível, estendi a mão a centenas de pessoas. Hoje, percorro o caminho inverso: o de ser ajudado.
E para coisa tão elementar! Desde um simples número de celular para divulgar meus textos, até caminhar para receber um amigo na sala de visitas.
Quando jovens, poucos chegam a botar na cachola que esta fase da vida haverá de ter um fim.
Ainda em criança, voltava da escola e, inocente, perguntei a meu pai quando seria meu ‘futuro’. Do nada, a resposta: ‘hoje’! Fiquei sem palavras.
Por dilatado tempo, essa resposta dormiu a meu lado. E eu, pensativo, envidava esforços para decifrá-la.
Hoje, concluo que o futuro é uma hipótese sem dimensão de tempo.
Como é bom ser criança, que não precisa de ajuda para viver bem, despida da necessidade de trabalhar.
A criança é, de graça, amiga de outra criança, confia em outra criança. Mais que isso: a felicidade parece jamais se afastar dela.
Precisar do auxílio de terceiros é problema que só aos adultos atinge.
A cada dia mais, eles se socorrem da ajuda do outro para conquistar paz interior, mas raramente a encontram.
Precisar é preciso! Pelo menos para minorar, nas atribulações, os sofrimentos que nos cercam.
(*) GABRIEL NOVIS NEVES é médico e ex-reitor da UFMT.