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Barulho de motor à noite, falta de remédio e pouca comida: indígenas relatam mudanças após invasão de garimpeiros em Sararé em MT
Por Rogério Júnior, g1 MT
12/10/2025 - 17:05

Foto: arquivo pessoal

Barulhos incessantes de motores durante a noite, além do som alto de funk, falta de ervas medicinais e pouca comida. Essas são as principais mudanças na rotina do povo Nambikwara que viu escalar, nos últimos dois anos, a presença de garimpeiros ilegais e integrantes do Comando Vermelho na Terra Indígena Sararé, que fica em Pontes e Lacerda (MT), mas também alcança os municípios de Conquista D'Oeste e Vila Bela da Santíssima Trindade.

Ao g1, a filha do cacique Tainá Katitaurlu, de 37 anos, disse que o garimpo destrói a medicação natural ao desmatar a região, além de afastar e matar os animais nas florestas, que costumam ser caçados pelos indígenas para alimentarem a comunidade. Desde a chegada dos garimpeiros, o consumo de proteína animal caiu significativamente na aldeia.

"Ouvimos muito barulho de motores a noite inteira e, também, durante o dia. Nós ainda temos mandiocas, milho e banana, e vários tipos de alimentos, mas não temos carne. Os garimpeiros espantaram os animais ou mataram eles, como os peixes nos rios que morrem pela poluição", relatou.

Ela conta ainda que os garimpeiros ficam próximos da aldeia, cerca de 10 quilômetros, mas em razão do armamento pesado, os indígenas costumam evitar essa área para não se envolverem em conflitos.

"Nós pegamos remédios dentro do mato. Nosso povo precisa, assim como vocês, brancos, que têm remédios em farmácias. Essa riqueza é nossa dentro do nosso ambiente. É uma destruição esse garimpo. Dentro do mato temos muita medicação. Agora, todos esses anos foram destruídos e precisamos das matas, dos rios, que estão poluídos, peixes morrem e animais somem", disse.

A comunidade tem 201 habitantes e fica na região de fronteira com a Bolívia, uma das rotas mais usadas para o tráfico de drogas, segundo a Polícia CiviI. A partir de 2022, grupos criminosos se infiltraram na região e, em 2024, entraram no garimpo, sendo que parte deles são investigados pela destruição provocada na Terra Indígena Yanomami, em Roraima.

"Isso gerou atritos entre os garimpeiros, já foram três chacinas no ano passado, fora outros homicídios. Neste ano, começo de agosto, o Ibama desencadeou uma operação mais massiva para expulsar os invasores", disse João Paulo Berté, delegado da Polícia Civil.

A presença dos criminosos também se reflete no aumento de homicídios. Em Pontes e Lacerda, o número desse tipo de crime subiu para 60 desde 2023, e todos com envolvimento com o garimpo ilegal.

Além disso, as facções se abastecem de ouro para manter as atividades. Isso causa ainda mais preocupação às autoridades pela dificuldade no combate.

"É uma facção que já arrecada muito dinheiro com crime, e endossa essa captação por meio da extração de ouro é pior ainda, porque é extremamente lucrativa, e dá menos problemas do que tráfico de drogas. Essa atividade tem uma fluidez mais rápida, porque ouro todo mundo compra, diferente das drogas. Isso que causa preocupação", afirmou.

Na sexta-feira (10), a Polícia Federal deflagrou a Operação Lençol de Areia, com objetivo de combater crimes em uma casa de prostituição e usurpação de bens da União no garimpo ilegal no interior do território.

Em setembro, os agentes do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) entraram em confronto com os garimpeiros na região, na quinta-feira (25). Em seguida, de domingo (28) a segunda-feira (29) houve novos confrontos no local, que provocou a fuga de diversos garimpeiros.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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