As prisões brasileiras estão, hoje, superlotadas, de norte a sul do país. geralmente em precárias situações higiênicas e pessoais - “amontoados” é a palavra correta.
O total de pessoas encarceradas no Brasil chegou a 726.712 em junho de 2016. Em dezembro de 2014, era de 622.202. Houve um crescimento de mais de 104 mil pessoas. Cerca de 40% são presos provisórios, ou seja, ainda não possuem condenação judicial. Mais da metade dessa população é de jovens de 18 a 29 anos, semi-escolarizados, pobres e moradores em áreas de riscos e 64% são negros, segundo o Departamento Penitenciário Nacional (Depen), do Ministério da Justiça.
A taxa de ocupação nacional das prisões é de 197,4% de sua capacidade. Já a maior taxa de ocupação é registrada no Amazonas: 84%; e 75% dos presos tem apenas o ensino básico. 62% das prisões estão relacionadas ao tráfico de drogas. Um alerta as autoridades: o Estado está perdendo essa guerra, vide o Rio de Janeiro. Há 45.989 mulheres presas no Brasil.
Segundo o Diretor-geral, o Depen está investindo em políticas públicas que qualifiquem a porta de entrada, de saída e as vagas do sistema, de forma a propiciar um “ambiente prisional mais humano”. Somos o terceiro país com maior número de pessoas presas, atrás de Estados Unidos e China. O quarto país é a Rússia. A taxa de presos para cada 100 mil habitantes subiu para 352,6 indivíduos em junho de 2016. Em 2014, era de 306,22 pessoas presas para cada 100 mil habitantes.
O objetivo da prisão, na antiguidade, consistia, inicialmente, em desenvolver um sistema baseado no confinamento solitário, na instrução religiosa e na disciplina laboral. A “arquitetura moral” da prisão teria que expressar e incorporar estas finalidades e ao mesmo tempo melhorar a ordem, a saúde e as condições de seu funcionamento, sendo o propósito final, a “conversão” de prisioneiros incorrigíveis em “cidadãos exemplares”.
Naturalmente, a realidade desmentiu esse propósito. Hoje, as prisões são “escolas e faculdades” do crime, inclusive, do crime organizado, que domina os presídos. Aliás, estudiosos do assunto e autoridades reconhecem a respeito da situação dos presídios, e são geralmente unânimes na afirmação de que o condenado tem muito mais chance de aperfeiçoar-se no crime do que obter a reeducação que o harmonizará com a vida social, pelo ambiente de promiscuidade e contato com infratores “experientes” em que passa a viver.
Como “reeducar”, quem não teve “educação” regular? Nesse caso, não seria prudente pensar-se na prisão e encarceramento prioritariamente para os delitos de maior gravidade-estupros, homicídios, sequestros, pedofilia, e inclusive os grandes crimes do “colarinho branco”- desvio de verbas públicas, corrupção etc? A Assembleia Geral da ONU, em 1990, aprovou as Regras Mínimas das Nações Unidas sobre as Medidas não Privativas de liberdade, denominadas Regras de Tóquio, conclamando os Estados Membros da ONU a implementarem medidas e penas alternativas em seus respectivos sistemas penais.
No Brasil, somente na fase de transição da ditadura para a democracia politica, ocorrida no inicio dos anos 80 do século XX, é que foi intensamente refletida a situação criminológica mundial a favor da necessidade de se adotar medidas punitivas mais adequadas a realidade social, num movimento que originou a Reforma Penal de 1984. A Lei 9.099/95- Juizados Especiais Cíveis e Criminais, que produziu o que muitos consideram uma revolução no sistema de justiça criminal, popularizou as respostas penais alternativas à prisão, que até esse momento, gozavam de pouca credibilidade pelos operadores do sistema de justiça criminal.
Essa lei, prevê um tratamento diferenciado para as infrações de menor potencial ofensivo – considerados assim, aqueles com pena máxima não superior a um ano na Justiça Comum e dois anos na Justiça Federal - com possibilidade de conciliação entre as partes e transação com o Ministério Público, mediante a aprovação imediata da aplicação de uma pena restritiva de direitos ou multa, ou ainda, como nos casos dos países anglo-saxônicos, a suspensão condicional do processo por dois anos. A partir da Lei 9.714/98, as penas restritivas de direito adquiriram caráter de sanções autônomas e susbtitutivas das penas privativas de liberdade.
Conforme determina o art. 44 do Código Penal, as penas restritivas de direitos são autônomas e substituem as penas privativas de liberdade quando:”I – aplicada a pena privativa de liberdade não superior a 4 (quatro) anos e o crime não for cometido com violência ou grave ameaça à pessoa, ou, qualquer que seja a pena aplicada, se o crime for culposo; II – o réu não for reincidente em crime doloso; III – a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do condenado, bem como os motivos e as circunstâncias indicarem que essa substituição seja eficiente”.
Em resumo: a busca por alternativas à pena de prisão, ainda que baseada origináriamente em pressupostos reabilitadores e de direito penal minimo, faz parte da nova tendência mundial de expansão do direito penal, que decorre dos fundamentos globalizantes do sistema punitivo europeu e que se traslada aos demais centros do planeta implantando uma politica de não recrudescimento da punição e a ampliação do controle social pelo Direito Penal.
Não seria conveniente ao Estado Brasileiro se preocupar em punir com maior rigor aqueles que realmente mereçam o isolamento, e que, pelas protelações, brechas jurídicas e processuais, nunca ou raramente são punidos e, quando o são, se transformam em “heróis”e “vítimas”? Em lugar de encher as cadeias de “ladrões de galinha”?. 95% da população carcerária no Brasil é formada de homens e mulheres pobres e, em sua maioria, negros ou pardos, e de baixa escolaridade. “Matar o elefante é fácil. Difícil é remover o cadáver”- Mikhail Gorbachev (político russo).
AUREMÁCIO CARVALHO é advogado.