Bolívia: legislação permite linchamentos
Por Diário de Cuiabá
18/08/2012 - 09:57
Casos de linchamento como o que resultou na morte de dois varzea-grandenses, esta semana, são mais comuns do que se pode imaginar na Bolívia. Em certas comunidades, a Justiça pode ser feita pelos próprios moradores, sem interferência do Poder Judiciário.
Aprovada em 2009, pelo presidente Evo Morales, a “Ley Del Organo Judicial” dá às 36 comunidades indígenas do país autonomia para empregar seus próprios métodos judiciários, seguindo seus valores e costumes, de acordo com os “protocolos milenares” de cada um. A “justiça comunitária”, como é conhecida, permite que as diferentes tribos possam julgar os envolvidos em qualquer crime ocorrido em suas terras, sem que os condenados tenham direito de recorrer à decisão na justiça comum do país.
A “Ley Del Organo Judicial” faz parte da constituição boliviana e funciona paralelamente à Justiça Comum. Ela foi aprovada com o argumento de que os indígenas têm uma cultura de vida e não de morte. Morales ainda considera os princípios jurídicos dos outros países ditos civilizados como “ocidentais e racistas”. Dos quase dez milhões de habitantes do país, cerca de 60% são indígenas.
No entanto, dados de 2010 da Organização das Nações Unidas (ONU) mostram que o número de casos de linchamento na Bolívia é alarmante. Foram 30 ocorrências e 77 tentativas. Em 2007, foram registrados 57 casos.
Amparados pela lei, os indígenas responsáveis pelos linchamentos raramente sofrem qualquer tipo de punição. O caso ficou claro quando, em 2010, quatro policiais, suspeitos de homicídio e extorsão, sofreram linchamento e foram encontrados enterrados de cabeça pra baixo na localidade boliviana de Uncia.
Os policiais foram enterrados dessa forma, pois de acordo com a tradição indígena da tribo em questão, somente assim as almas das vítimas não assombrariam o assassino. Pelo menos um dos policiais tinha graves queimaduras no corpo, provocadas por água fervente. No entanto, mostrou-se tolerância em relação à tribo.
Em 2008, onze moradores foram espancados e queimados em um estádio de futebol por outra comunidade. Duas pessoas morreram e nove ficaram gravemente feridas.
A prática do linchamento é muito antiga e faz parte da cultura de várias tribos indígenas, não só na Bolívia, mas também de outros países sul-americanos. É geralmente definida como o assassinato de um indivíduo ou pequeno grupo por uma multidão, sem o procedimento judiciário legal e em detrimento de todos os direitos básicos do cidadão.
Geralmente, as comunidades alegam que não acreditam mais no poder da polícia e no aparato legal, e por isto resolvem fazer justiça “com as próprias mãos”. Além dos linchamentos, a Justiça Comunitária pode determinar outra penalidade ao criminoso.