Em Mato Grosso foram identificados nove povos indígenas que ainda vivem isolados sem contato com o resto da civilização. Eles estão localizados principalmente na região Norte do Estado, em que abrange a floresta Amazônica. Os dados foram repassados pelo coordenador regional de Cuiabá da Funai, Benedito Garcia.
Ele ressalta que este número é possível de alteração, uma vez que os dados são antigos, o acompanhamento é remoto, devido a dificuldade de acesso, além disso, não é possível estimar a população geral destas nove tribos, em função das perseguições que sofrem, o que acaba por colocá-las em risco. Há ainda a possibilidade de existirem outras tribos que não foram localizadas ou inseridas no relatório atual, por terem sido descobertas mais recentemente.
O assunto ganhou notoriedade há pouco mais de três anos, quando funcionários da Funai conseguiram registrar imagens e vídeo da tribo Kawahiva, quase na fronteira com o Estado do Amazonas, e ganhou repercussão na mídia nacional. Este é um povo nômade que não vive da agricultura e quando uma região não oferece mais caça, eles migram para outra.
Como tentativa também de mantê-los isolados, a Funai procura acompanhar o andamento desses índios e no caso das terras indígenas Piripkura, localizadas entre os municípios de Colniza e Rondolândia, foi baixado ato ministerial que renovou a restrição de entrada e permanência de pessoas estranhas na área.
Os registros de povos isolados em Mato Grosso ocorreram nos municípios de Aripuanã, que teria o maior número de tribos sem contato, com três; Cotriguaçu, com duas; e ainda em Juína, Comodoro, Apiacás e na divisa entre Tabaporã e Juara.
Segundo a Fundação Nacional do Índio, atualmente, no Brasil temos cerca de 107 registros da presença de índios isolados em toda a Amazônia Legal, tendo em vista que o Amazonas libera este ranking com a identificação de, pelo menos, 16 povos. Após mais de 500 anos de colonização, os índios ainda são alvos de perseguição principalmente por parte de fazendeiros, madeireiros ou grileiros. Com a ameaça do “homem”, estes povos que vivem isolados correm risco de acabar extintos.
Por isso, a Funai possui a Coordenação Geral de Índios Isolados e Recém Contatados (CGIIRC) que busca descobrir, estudar e acompanhar esses povos, no entanto, preservando-os longe do contato com a civilização. As diretrizes da política indígena defende inclusive que seja respeitado o direito do índio em não aceitar o convívio e a não obrigatoriedade da colonização.
Alguns destes povos isolados optaram por assim viver. Os registros históricos da Funai revelam que a decisão do isolamento pode ser devido aos encontros com efeitos negativos com a sociedade, o que acaba por levar doenças, epidemias, mortes, além dos atos de violência física, moral, cultural e ainda a espoliação dos recursos naturais de sobrevivência deles. Os povos isolados não querem manter contato nem mesmo com outros indígenas e isto deve ser respeitado.
Outra preocupação que leva a Funai tentar evitar o contato com os não índios é com relação à questão da saúde, já que o convívio com a civilização também leva doenças com as quais o organismo do índio não está preparado para receber. Já tiveram casos de surtos de sarampo, em que centenas de índios morreram no Estado em décadas passadas. Para fazer este acompanhamento, a Funai conta com a CGIIRC.
Gilberto Leite/Rdnews
Coordenador da Funai em Cuiabá, Benedito Garcia, explica que o acompanhamento das tribos ainda é bastante remoto
Algumas tribos possuem poucos membros e resistem ao contato com os “brancos”. Neste sentido, quando há certa insistência de contato, os índios acabam os tratando como inimigos, e, sentindo-se ameaçados, agem até mesmo com violência com uso de arco e flecha.
Piripkura
Um dos povos que correm o risco de ser extintos é o Piripkura, denominação dada pelos vizinhos, os índios Gavião, também conhecido por ‘povo borboleta’, devido a maneira como eles percorrem as florestas.
Na década de 80, quando foi feito o primeiro registro dos povos pela Funai, eram cerca de 20 pessoas, mas depois de muito tempo sem contato, em 1998, dois índios saíram e fizeram contato com a equipe da Funai para conseguir atendimento médico. Neste período, um dos integrantes da tribo contou um pouco sobre o estilo de vida deles, e ficou registrado que o povo vem sendo reduzido devido aos massacres cometidos pelos “brancos”.
As terras destes povos, que estariam juntos com os Mande-í e Tucan, são constantemente invadidas por madeireiros ilegais. A Survival, um movimento global pelos direitos dos povos indígenas, acompanha os índios isolados e teme pela extinção deles.
Kawahiva do Rio Pardo
Outra tribo acompanhada é a Kawahiva do Rio Pardo. A extinção ocorre não apenas pelos massacres de madeireiros e outros invasores, mas porque eles teriam parado de ter filhos, devido as constantes fugas dos perseguidores.
Estes índios estão na região de Colniza, uma das cidades mais violentas do Estado e com alto índice de desmatamento, por conta da ação de madeireiros clandestinos na floresta. Para tentar preservar o grupo, um procurador federal lançou uma investigação sobre o genocídio desses Kawahiva.
Em abril deste ano, o ministro da Justiça, Eugênio Aragão, assinou portaria declaratória reconhecendo o território como posse da tribo Kawahiva. A campanha lançada, em outubro do ano passado pela Survival, para pressionar o governo federal agir para preservar este povo, ganhou apoio do vencedor do Oscar de melhor ator coadjuvante, com o filme Ponte dos Espiões, Mark Rylance.