Paz na relação não cai do céu. Ela é conquistada com transparência.
Amado e odiado, o celular é motivo de casamentos e de divórcios. Mas, a questão é: por que quando o cônjuge toma banho ou está longe do celular, mexer naquele aparelho nos tenta mais que chocolate? Simples: temos medo de sermos enganados.
Mexer no celular do outro, mais do que uma tentação, é um ato sério que vai muito além de uma simples dança de dedos em uma tela iluminada. É que a violação da intimidade, do sigilo e do segredo pode configurar crime. Mas, será que entre quatro paredes de um lar conjugal isso vale?
Primeiro, saiba a diferença: o segredo é faculdade ou algo guardado por vontade de alguém. O sigilo decorre de lei ou contrato que impõem que algo não seja divulgado. Já a intimidade é a informação que reservamos só para nós, ou seja, o que pensamos e fazemos em casa, quando ninguém está olhando. Exemplifico: é o segredo que o amigo pede, o sigilo profissional que o médico deve guardar e a nossa intimidade sexual.
Violar segredo, divulgar sigilo ou expor a intimidade são crimes no Brasil. Mas, quando isso ocorre dentro do casamento, as opiniões dos Tribunais e estudiosos da matéria se dividem. Uma corrente de juristas entende que a comunhão de vida e interesses pelo casamento não comporta segredos, pois ao casar compartilhamos tudo, até a nossa intimidade. Uma segunda corrente de juristas é mais conservadora e segue a ideia de que o casamento não dá autorização para que um devasse a intimidade e segredos do outro.
Mas, afinal, posso ou não posso mexer no celular do cônjuge? O que os Tribunais decidem? Posso ser punido? Vamos por partes.
O que vem sendo decidido pelo Poder Judiciário é que o fato de estarmos casados não autoriza a devassa do celular do outro quando não há autorização do dono da informação – aqui, lembre da diferença entre “dono do celular” e “dono da informação”, pois o celular, quando não consistir em item pessoal ou profissional, pode ser de ambos (pelo regime de bens), mas não a intimidade.
Quanto a “ser punido”, dificilmente a violação do celular do cônjuge configurará crime ou virará um processo criminal. Contudo, pode gerar indenização, quando houver divórcio e quando cause dor ou humilhação graves e acima de um mero aborrecimento.
Então, a regra é: quando não autorizado ou quando não lhe franqueada a senha, o celular do cônjuge é ambiente íntimo protegido e pode, além de uma bela briga, implicar violação a um dever conjugal, especificamente o de respeito e consideração (art. 1.566, inciso V, do Código Civil).
Prevenir é melhor do que remediar. Então, pedir a senha é o melhor caminho para uma relação transparente e equilibrada. Afinal, entre resistir ao celular e resistir ao chocolate, é melhor ceder a esse último, que lhe renderá, no máximo, uns quilos a mais.
Leandro J. Giovanini Casadio é advogado e sócio de Brasil Salomão e Matthes Advocacia. Coordenador das filiais Rondonópolis/MT e Cuiabá/MT
Marcelo Xavier é advogado e sócio de Brasil Salomão e Matthes Advocacia.