O Ministério Público Federal (MPF), por meio da Procuradoria da República no município de Cáceres, localizado a 220 quilômetros da capital Cuiabá, ingressou na Justiça Federal contra a União, o estado de Mato Grosso, o Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama), o município de Cáceres e 35 pessoas, identificadas como responsáveis por danos ambientais à margem esquerda do Rio Paraguai.
A ação civil pública foi ajuizada pelos procuradores da República Bernardo Meyer Machado, Júlio César de Almeida e Valdir Monteiro Oliveira Júnior, que atuam em Cáceres. Os danos são decorrentes de edificações realizadas em Área de Preservação Permanente (APP) desde 1990 e, apesar de várias tentativas, não foi resolvido extrajudicialmente.
A ACP diz respeito às construções irregulares realizadas na quadra 95, que estão dentro dos 50 metros de área de preservação da Baía da Palha, nos lotes de 1 a 30, e mais dois lotes sem registro na Prefeitura de Cáceres, localizados em área pública, tudo na Rua das Águas, no bairro atualmente denominado Jardim das Oliveiras. A área ocupada era anteriormente de propriedade da Empresa Mato-grossense de Pesquisa, Assistência e Extensão Rural (Empaer).
A grande maioria das construções é para moradia, apesar de ter sido localizada uma pousada no local. Como vários moradores são beneficiários do Programa Bolsa Família e do Auxílio Emergencial, foi indicada pelos procuradores a necessidade de inserção da Defensoria Pública da União na ação.
Entenda o caso - O primeiro registro sobre a ocupação irregular da área se deu em maio de 1998 quando o presidente da Associação de Moradores da Antiga Empa, à época, informou ao Ministério Público Estadual sobre os conflitos fundiários no local. Já naquele ano ocorria degradação ambiental, e tanto o Ibama quanto a Fema (atual Secretaria Estadual de Meio Ambiente – Sema/MT) não tomaram providências suficientes sobre o fato.
Durante os 20 anos seguintes, várias foram as tentativas para regularizar a situação de maneira extrajudicial, como a expedição de recomendação ministerial, realização de audiência pública e notificações por infração ambiental, porém sem sucesso. Com isso, foi requisitada pelo MPF a confecção de laudos a fim de identificar os responsáveis atuais, e judicializar a questão.
Os laudos identificaram que os lotes da quadra 95 estão parcialmente no interior da faixa de área de proteção permanente de 50 metros da Baía da Palha.
Descaso – Três são os fatores que levaram os procuradores da República a acionar a União, o Ibama, o estado de Mato Grosso e o município de Cáceres, sendo o principal deles a inércia quanto à proteção do meio ambiente, já que desde 1998 a área, que é objeto das ações civis, sofre degradação ambiental.
Os outros dois são a possibilidade de demolição das construções, que os três entes da Federação poderão ser obrigados a executar; e a possível correção por meio da Regularização Fundiária Urbana (Reurb), que demanda participação de União, estado e município.
Reurb - Nesta hipótese, os procuradores ressaltam que é possível a regularização da área por meio da Reurb prevista na Lei Federal 13.465, de 11 de julho de 2017, desde que atendidos os critérios do Manual da Câmara de Meio Ambiente e Patrimônio Cultura do MPF (4CCR/MPF). Entretanto, deve haver interesse e esforço por parte dos requeridos, e não será permitida a regularização individual.
Para iniciar o diálogo nesse sentido, o MPF manifestou interesse em realizar audiência de conciliação, ressalvando que, de toda sorte, deverão ser concedidas as tutelas provisórias pleiteadas e o processo deverá seguir sua instrução regular. Assim, apenas por ocasião da sentença deverá ser avaliado se houve ou não Reurb bem-sucedida, e qual o impacto disso no mérito.
Dos pedidos – Uma vez que se trata de demanda complexa, o Ministério Público requereu diversas medidas processuais específicas, sendo uma delas a citação prevista para ações possessórias em que figuram no polo passivo grande número de pessoas (art. 554 do Código de Processo Civil). Nesta modalidade de citação, há ampla publicidade da existência da ação, inclusive por anúncios em jornal ou rádio locais.
Além disso, foi solicitada em medida cautelar a fixação de placas nas quadras, em local de grande visibilidade, informando sobre o litígio e alertando aqueles que se sentirem prejudicados a constituir advogado e integrar o processo para exercer o contraditório.
Também foi requerido que os cartórios de Cáceres, a prefeitura e a Secretaria do Patrimônio da União (SPU) monitorem futuros negócios jurídicos envolvendo os lotes objeto das ações, e informem a Justiça no prazo de 15 dias, sob pena de multa diária.
O MPF pediu também tutela provisória para que a pousada comunique aos clientes o fato de não possuir licença ambiental, conscientizando-os quanto à irregularidade do empreendimento.
Por fim, também foi pleiteado que todas as pessoas físicas identificadas informem o passivo ambiental da área a futuros compradores ou locatários dos imóveis, juntando comprovante nos autos, sob pena de multa diária.
A ação civil pública tramita na 1ª Vara da Subseção Judiciária de Cáceres, com número 1001944-18.2020.4.01.3601.