O cheiro do pequi nas ruas do Centro, a Igreja do Bom Despacho sobressaindo aos semáforos, as mulheres que caminham ao lado do aço de Maria Taquara. Uma cidade não é só pedra, mas todo o imaterial que também a levanta. Olhando para a cidade onde vivem, cinco autores escrevem “Água não tem galho”. O livro, que será lançado amanhã, dia 11 de dezembro, reúne contos ambientados em Cuiabá.
Aldi Nestor, Andreza Pereira, Loreci Demeneghi, Rose dos Anjos e Santiago Santos juntam diferentes narrativas do lugar em que moram, onde alguns deles nasceram, para onde outros vieram, do Nordeste, do Sul do Brasil. É uma junção também de estilos de escrita, de experiências do urbano e de uma cultura regional que não é pura ou imóvel.
Os cinquenta contos, dez de cada autor, têm em comum o espaço: todos se passam em Cuiabá. Essa referência é feita de diferentes formas nos textos, explícita em uns, simbólica em outros, conforme a conotação da cidade em cada história. Assim, num conto que apresenta o sapateiro Belarmino, cujo comércio é cada vez mais comprimido pelas transformações econômicas, a rua Galdino Pimentel aparece clara em sua geografia. Em outro conto, em que uma menina estranha a tristeza do pai recluso no escuro do seu quarto, Cuiabá é apenas “a cidade do sol”.
Santiago Santos, um dos escritores, comenta que o livro é um exercício, uma “tentativa literária” de contar o lugar, “uma situação estranhamente desconfortável, porque a primeira coisa que se torna visível é não o que escolhemos ilustrar, mas a enormidade de coisas que acaba ficando de fora”. Conta que havia a preocupação de buscar os elementos cotidianos, visuais, sensíveis da cidade sem resvalar para o clichê. Na inevitável apreensão inacabada do espaço, “Cuiabás que são próximas de cada um dos cinco autores foram habitadas por suas personagens, formando um quebra-cabeça subjetivo”.
Para que esse retrato imaginado fosse menos incompleto, ele buscou contribuir com a sua carga enquanto leitor e autor: “Às vezes faltava humor, às vezes um tipo específico de vivência, às vezes a narrativa de uma idade específica. Dada a minha ligação com os quadrinhos e a fantasia especulativa, o livro não seria tão meu se não tivesse um personagem como Jourrúbio, um autêntico super-herói cuiabano movido a farofa de banana. É uma Cuiabá única, porque é a nossa Cuiabá”.
Andreza Pereira percebeu na diversidade dos contos produzidos como o elemento espaço pode se ressignificar nas narrativas. “O modo como a cidade chega aos seus habitantes é muito complexo, está visível nos trajetos cotidianos, mas também no nosso vocabulário. Tentar transpor essa amplitude para a escrita resultou num livro tematicamente fluido, muito plural”.
Os textos foram ordenados conforme a idade de seus protagonistas, ilustrando a passagem da vida na (e da) cidade. A obra integra os projetos culturais selecionados e financiados pelo edital de 2019 da Prefeitura Municipal em valorização aos 300 anos de Cuiabá.
Coletivo literário