Imagine que, no átrio do Fórum onde você foi buscar o auxílio da Justiça Estadual para a resolução de um conflito, você tivesse à disposição diversas portas e, dependendo do problema apresentado, pudesse ser encaminhado para aquela mais adequada à efetiva solução do seu caso. Em síntese, isso resume o conceito do sistema de “Justiça Multiportas”, apresentado em 1976 pelo emérito professor e reitor associado da faculdade de Direito de Harvard, Frank Sander, durante uma conferência realizada nos Estados Unidos. Nesse encontro, há 45 anos, a insuficiência do Poder Judiciário para atender a todas as suas demandas já era tema de discussão. Segundo a coordenadora do Núcleo Permanente de Métodos Consensuais de Resolução de Conflitos do Poder Judiciário de Mato Grosso (Nupemec), juíza Cristiane Padim da Silva, tradicionalmente, a resolução dos conflitos se circunscreve ao processo judicial, por meio de uma sentença proferida pelo magistrado. No entanto, ela enfatiza que desde 2010 o Judiciário brasileiro vem oferecendo outros meios de solução de disputas, outras “portas” mais adequadas à natureza de cada controvérsia, como a mediação e a conciliação.
“Agora o procedimento é realizado de acordo com a causa, partindo da ideia de que cada método resolutivo, mesmo o tradicional, possui vantagens e desvantagens. O método tradicional, por exemplo, é extremamente eficaz para responder questões que se refiram a direitos indisponíveis, e em causas onde há um grande desequilíbrio de poder entre as partes, mas, em contrapartida, despreza quase completamente o lado sociológico e psicológico da demanda. A mediação, por sua vez, trata mais eficazmente as questões e se ocupa em resgatar a comunicação entre as partes”, observa a magistrada. A coordenadora do Nupemec explica que a ideia do tribunal multiportas é que o jurisdicionado, ou seja, qualquer cidadão que tenha algum problema que possa ser judicializado, tenha à sua disposição uma série de opções para resolver o conflito, entre as quais a mediação, a conciliação e os meios alternativos de solução de conflitos, que são os pilares da reforma processual.
“Nesta perspectiva, o acesso à Justiça não diz respeito exclusivamente à chegada ao Poder Judiciário pela interposição de uma ação, mas, também e principalmente, ao acesso efetivo a uma ordem jurídica justa e em tempo razoável, e isso o sistema de justiça multiportas tem oferecido ao jurisdicionado, com a disponibilização dos métodos autocompositivos, que são mais céleres, mais adequados ao perfil de cada caso e menos onerosos”, enfatizou a juíza Cristiane Padim. A magistrada lembra que, em entrevista recente publicada no site do Conselho Nacional de Justiça, o ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, do Superior Tribunal de Justiça, que preside o Grupo de Trabalho do CNJ para custas processuais e justiça gratuita, destacou que a noção de acesso à justiça não pode ficar limitada ao acesso ao Judiciário. “Ele deve ser entendido no contexto contemporâneo que o novo Código de Processo Civil (CPC) criou: uma justiça multiportas que deve oferecer a todos os cidadãos uma solução justa para seus problemas e que não necessariamente passa por demandas judiciais”, afirmou o ministro. Para a juíza Cristiane Padim, a Resolução n. 125/2010 do Conselho Nacional de Justiça foi fundamental para a implementação do sistema de Justiça Multiportas, por constituir-se no primeiro regramento quanto à implementação e aplicação adequada das técnicas autocompositivas nos tribunais de todo o país. “Além disso, o rigor metodológico por ela estabelecido exige a capacitação continuada com vistas ao aperfeiçoamento constante dos profissionais que atuam com os métodos autocompositivos, no âmbito judicial.” Confira
mais informações sobre o trabalho do Nupemec, atualmente presidido pelo desembargador Mario Roberto Kono de Oliveira.