Juiz julga improcedente última ação de Leonardo contra Francis
Por assessoria
20/11/2012 - 19:42
O juiz eleitoral de Cáceres, Geraldo Fidelis, julgou improcedente a ultima das cinco ações com pedido de cassação da candidatura do prefeito eleito de Cáceres, Francis Maris Cruz (PMDB), feita pela coligação O Futuro Começa Agora, encabeçada pelo médico Leonardo Albuquerque (PSD). Desta feita o magistrado não aceitou a denuncia de que o Jornal Cacerense, tentado prejudicar Leonardo e favorecer Francis com uma matéria sobre o acidente em que o cinegrafista da campanha do médico, José Ferreira, atropelou Jaqueline Santana e matou a técnica da Secretaria de Meio Ambiente e Turismo (Sematur), Maria Sophia Leite, no final de setembro. Das cinco ações, três estão extintas.
As outras ações indeferidas foram por suposto abuso de poder econômico e uso do Jornal Oeste, outra sobre a suposta compra de uma receita de remédio, uma ação contra a vice-prefeita eleita, Eliene Liberato Dias, pelo suposto uso do programa de casas populares para promoção eleitoral e uma sobre o uso de um caminhão do Grupo Cometa para fins eleitorais.
Veja a íntegra da sentença:
20/11/2012 14:17:24 -Registrado Sentença de 19/11/2012. Com Mérito. Julgado improcedente o pedido (Cód. 220 CNJ) - ZE06 - CARTORIO DA 06 ZONA ELEITORAL - CACERES
Sentença em 19/11/2012 - AIJE Nº 34091 Dr. GERALDO FERNANDES FIDELIS NETO
Vistos etc...
A Coligação “O Futuro começa agora” ajuizou a presente Ação de Investigação Judicial Eleitoral com pedido liminar em desfavor de Francis Maris Cruz, Antônia Eliene Liberato Dias, Jornal Correio Cacerense e João Arruda, sustentando que os representados distribuíram na data de 03/10/2012, milhares de exemplares do Jornal Cacerense pelos bairros desta cidade.
Segundo consta da inicial, os exemplares do jornal normalmente são expostos à venda em bancas de jornal, o que não ocorreu na data supra mencionada, oportunidade em que foram veiculadas matérias de cunho depreciativo ao candidato Leonardo Albuquerque com os seguintes dizeres: “cinegrafista da campanha de Leonardo atropela duas pessoas. Sophia morre, Jaqueline segue em estado grave.” Abaixo da matéria em destaque, há um santinho do candidato Francis Maris.
Em outras páginas do periódico seguem notícias que veiculam a imagem do candidato Leonardo Albuquerque ao acidente ocorrido e ainda fazendo alusões ao pleito eleitoral que se aproximava.
Aduz a representante que o acidente noticiado ocorreu em 29/09/2012 e, somente em 03/10/2012, os representados noticiaram o ocorrido com a nítida intenção de denegrir o candidato da Coligação representante. A inicial afirma que “o abuso do poder econômico e o uso indevido dos meios de comunicação social são evidentes, o abuso diante do próprio ato de distribuir os exemplares e o uso indevido por veicular o acidente no periódico de forma gratuita, como forma de obter vantagem eleitoral por meio de denegrir a imagem do candidato da coligação representante.” (fls. 05)
A representante apontou a existência de afronta ao artigo 243 do Código Eleitoral e ainda aos artigos 323, 325 e 326, do mesmo diploma legal. Segundo afirma, no caso versando, houve a prática do crime de corrupção eleitoral, configurada pela doação e distribuição de periódicos nos bairros e comunidades.
Pugnou pela concessão de liminar imediata, a fim de que os representados se abstenham de publicar qualquer matéria afirmando que o representante tenha vínculo com o acidente ocorrido e que vitimou duas pessoas e, no mérito, requereu a procedência da ação de investigação eleitoral, com a declaração de cassação da candidatura dos candidatos representados e a conseqüente inelegibilidade deles, além de multa. Para comprovação de suas alegações, os representantes colacionaram aos autos um exemplar do material guerreado (fls. 15/19).
A liminar pleiteada foi concedida às fls.23/26, sob o argumento de que embora a liberdade de imprensa esteja estampada como corolário da liberdade de expressão e, constitucionalmente garantida, tal direito não pode ser inflado a ponto de ferir a garantia da isonomia entre os candidatos, de modo que foi determinado ao Jornal Cacerense que se abstivesse, a partir de sua notificação, de veicular qualquer matéria referente à suposta vinculação da coligação representante e/o seu candidato ao acidente que vitimou duas pessoas.
O investigado João Benedito Alves de Arruda & Cia. LTDA- ME, ofertou defesa às fls. 32/36, argumentando que não houve qualquer irregularidade em sua conduta e ainda, não houve qualquer manipulação dos fatos para proteger ou prejudicar quem quer que seja, posto que apenas noticiou os fatos ocorridos e a comoção pública com o evento. No tocante à publicação extemporânea, aduziu o investigado que na data do fatídico acidente já contava com sua edição “fechada” e sua próxima edição seria dia 03/10. Destaca ainda que normalmente a distribuição do periódico se dá aos sábados, porém, em face das eleições e do feriado do dia 06 de Outubro, a distribuição se deu no dia mencionado, ou seja, na quarta-feira. Aduz, também, que não houve qualquer injúria ou difamação contra qualquer pessoa, de modo que requereu a improcedência da inicial.
Acostou documentos aos autos às fls. 37/53.
Às fls. 54/69, os representados Francis Maris Cruz, Antônia Eliene Liberato Dias e “Coligação Cáceres rumo ao desenvolvimento” ofertaram contestação sob o argumento de que a inicial representa “afrontosa e inadmissível violação aos direitos à informação e a liberdade de expressão, constitucionalmente assegurados (arts.5º e 220)” (fls. 55). Justificam a assertiva sob o argumento de que a representante “agiu dolosamente ao omitir em sua inicial que efetivamente, de forma criminosa, entregou veículo que estava sob sua responsabilidade a uma pessoa sem habilitação, que havia ingerido álcool e possivelmente outras drogas (a ser confirmado pelo exame toxicológico), e que essa pessoa, que era uma das responsáveis pela produção de seus programas eleitorais, nessas lastimáveis condições, realmente atropelou duas ciclistas, pessoas muito conhecidas e queridas por toda a população cacerense, e que uma delas faleceu e a outra foi internada em uma UTI” (fls. 56/57)
Segundo a peça de defesa, o meio de comunicação Jornal Cacerense apenas veiculou fatos verídicos que causaram intensa comoção social em Cáceres, a exemplo de vários outros jornais desta cidade. No tocante à maior tiragem do jornal ou ainda, a ampla divulgação do periódico, aduz os representados que não tiveram qualquer influência nos referidos atos, já que é comum aos meios de comunicação dar maior ênfase ou destaque a matérias de maior interesse social.
Por fim, requer a responsabilização do representante da Coligação “O futuro começa agora” pela prática do crime tipificado no art. 25, da LC 64/90, bem como a improcedência da presente ação de investigação judicial eleitoral. Documentos foram acostados aos autos às fls. 70/103.
Em audiência de instrução e julgamento realizada na data de 17 de Outubro de 2012, foram inquiridas as testemunhas Norma Piran e Wilson Kishi. Em continuidade, na data de 22 de Outubro de 2012, foram oitivadas as testemunhas Augusta Maria Cardoso e Leonardo Albuquerque Ribeiro.
Às fls. 122/136, dos autos foi acostado comprovante de pagamento da edição do jornal combatida, lista de assinantes e pontos de venda do Jornal Cacerense, bem como, às fls. 145, a Gráfica Nova Cáceres informou que o pagamento da edição nº605, ano 08, foi realizado pelo jornalista João Arruda.
Em alegações finais, o ilustre representante do Ministério Público Eleitoral pugnou pela improcedência da presente ação de investigação judicial eleitoral ante a inexistência de comprovação de abuso indevido dos meios de comunicação (fls. 149/150).
A Coligação representante, por seu turno, requereu a procedência da inicial ante a comprovação de que o Jornal Cacerense deturpou a verdade dos fatos ocorridos e ainda, distribuiu milhares de jornais pelos bairros da cidade. Aduz ainda em suas alegações derradeiras que “o abuso de poder econômico e o uso indevido dos meios de comunicação social são evidente, o abuso diante do próprio ato de distribuir os exemplares e o uso indevido por veicular o acidente no periódico de forma gratuita, como forma de obter vantagem eleitoral por meio de denegrir a imagem do candidato da coligação representante” (fls.152/160).
O representado João Benedito Alves de Arruda & Cia LTDA, aduziu em suas alegações finais, que não restou comprovada qualquer ilegalidade praticada na conduta do jornal representado, de modo que apenas registrou a comoção popular que seguiu-se ao lamentável acidente ocorrido nesta cidade (fls.161/162).
Os representados Coligação “Cáceres rumo ao desenvolvimento”, Francis Maris Cruz e Antônia Eliene Liberato Dias, em suas alegações derradeiras de fls. 163/171, manifestaram-se pela improcedência da inicial, ante a inexistência de comprovação de qualquer irregularidade no impresso aventado na inicial.
É o relato. Decido.
O art. 22 da Lei Complementar nº 64/90 dispõe que a propositura de ação de investigação judicial eleitoral objetiva a apuração de abuso do poder econômico ou político e de uso indevido dos meios de comunicação social, em benefício de candidato ou partido político, verbis:
Art. 22. Qualquer partido político, coligação, candidato ou Ministério Público Eleitoral poderá representar à justiça eleitoral, diretamente ao Corregedor-Geral ou Regional, relatando fatos e indicando provas, indícios e circunstâncias e pedir abertura de investigação judicial para apurar uso indevido, desvio ou abuso do poder econômico ou poder de autoridade, ou utilização indevida de veículos ou meios de comunicação social, em benefício de candidato ou partido político (...)”
De acordo com o manual produzido pelo Tribunal Regional Eleitoral, “A AIJE é a ação jurídica pela qual se busca tutelar o princípio constitucional da proteção da normalidade e legitimidade das eleições, ou seja, o interesse público primário da lisura eleitoral. Tais bens jurídicos ínsitos ao regime representativo são violados quando há abuso do poder econômico, político ou dos meios de comunicação social, a desequilibrar o pleito a favor de determinada candidatura” (BRASIL. Tribunal Regional Eleitoral de Mato Grosso. Ações e representações eleitorais.- Cuiabá:TRE-MT, 2012).
O abuso de poder configura-se por toda conduta abusiva de utilização de recursos financeiros, públicos ou privados, ou de acesso a bens ou serviços em virtude do exercício de cargo público que tenha potencialidade para gerar desequilíbrio entre os candidatos, afetando a legitimidade e a normalidade das eleições. Tamanha a potencialidade lesiva do abuso de poder, que sua utilização durante o pleito é vedada inclusive pela Constituição Federal, em seu art. 14,§9º, da Constituição Federal.
Dentre as espécies de abuso de poder vedadas pela Carta Magna e pormenorizadas pela Lei Complementar 64/90, encontra-se o abuso de poder econômico que pode ser caracterizado quando ocorre doação de bens ou desvantagens a eleitores de forma que essa ação possa desequilibrar a disputa eleitoral e influenciar no resultado das eleições, afetando a legitimidade e normalidade do pleito. Para o TSE, o abuso do poder econômico é a utilização, em benefício eleitoral de candidato, de recursos patrimoniais em excesso.
Por seu turno, o uso indevido dos meios de comunicação social ora se apresenta na forma de abuso do poder econômico, ora na posição abuso de poder político. Considerando que os meios de comunicação social, representados por emissoras de rádio e televisão, internet, jornais e similares, têm grande poder de influência sobre a opinião pública, eles sofrem especiais restrições no âmbito do processo eleitoral.
Exemplos disso são as emissoras de rádio e televisão, concessionárias de serviço público, que são proibidas de manifestar opinião ou transmitir propaganda paga durante o período eleitoral (art. 44 da Lei nº 9.504/97). Quanto aos outros meios de comunicação, é possível dizer que não sofrem tantas restrições, porém eventual conduta abusiva pode configurar uso indevido de meio de comunicação social ou abuso de poder.
Conceituando comunicação social, Uadi Lammêgo Bulos preleciona:
“Comunicação é a palavra que deriva do latim comunicare, significando trocar opiniões, conferenciar. Em sentido lato, abrange toda e qualquer forma de exteriorização do pensamento escrito ou oral, através de sons ou imagens, como no caso dos auto-falantes colocados num árvore ou no cume de igrejas. Em sentido estrito, porém, comunicação é o ato de emitir idéias, veiculadas em jornais, revistas, rádios, televisões, dentre tantos instrumentos técnicos que propiciam a manifestação do pensamento, quer através da criação e da expressão, quer por intermédio de informação.
O qualificativo social designa o meio pelo qual a comunicação se veicula, isto é, através dos meios de informação da massa, atingindo pessoas indeterminadas e em número ilimitado.
Quando o constituinte utiliza o signo comunicação social, a etimologia do termo vem à tona em toda sua amplitude, expressando, inclusive, a liberdade de manifestação do pensamento, da criação e da informação.” (Constituição Federal Anotada, 4ª ed – São Paulo: Saraiva, 2002, p. 1260/1261)
Do conceito exposto, extrai-se que qualquer meio de comunicação de massa pode ser incluído no conceito de meio de comunicação social, dentre eles, os jornais impressos.
Antes de adentrar ao mérito da questão, verifica-se que, ante a natureza da referida ação judicial, cumpre inicialmente destacar a ilegitimidade passiva do Jornal Cacerense, posto que o representado é pessoa jurídica e, portanto, não poderá sofrer as reprimendas decorrentes da presente ação de investigação judicial, quais sejam, inelegibilidade ou ainda, cassação.
Em casos semelhantes, julgou o Tribunal Superior Eleitoral, verbis:
AGRAVO REGIMENTAL. REPRESENTAÇÃO. OFENSA À LEI E À CONSTITUIÇÃO. ABUSO DE PODER ECONÔMICO. EMISSORAS DE RÁDIO E TELEVISÃO. TRATAMENTO DISCRIMINATÓRIO. CANDIDATOS. PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA. COBERTURA JORNALÍSTICA. DEBATES. ELEIÇÕES DE 2010. VIOLAÇÃO. DIREITO À INFORMAÇÃO. PRINCÍPIO DA ISONOMIA. IMPOSSIBILIDADE. PESSOA JURÍDICA. INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL. RENOVAÇÃO. NECESSIDADE. FATOS NOVOS. DECISÃO. FUNDAMENTOS. PRINCÍPIO DO LIVRE CONVENCIMENTO MOTIVADO. PROVIMENTO NEGADO.
“(...)”
“2. É entendimento pacífico deste Tribunal a impossibilidade de pessoas jurídicas figurarem no polo passivo de ações de investigações judiciais eleitorais fundadas no art. 22 da Lei Complementar no 64, de 18 de maio de 1990. Precedentes.”
“(...)”(TSE, AgR-Rp - Agravo Regimental em Representação nº 321796 - Brasília/DF, Acórdão de 07/10/2010, Relator(a) Min. ALDIR GUIMARÃES PASSARINHO JUNIOR, DJE - Diário da Justiça Eletrônico, Tomo 229, Data 30/11/2010, Página 7-8)” – grifei.
REPRESENTAÇÃO. INVESTIGAÇÃO JUDICIAL. ARRECADAÇÃO IRREGULAR. RECURSOS DE CAMPANHA ELEITORAL. INDEFERIMENTO DE INICIAL. AGRAVO REGIMENTAL. NÃO-INFIRMAÇÃO DOS FUNDAMENTOS DA DECISÃO IMPUGNADA. DESPROVIMENTO.
(...)
“As pessoas jurídicas são partes ilegítimas para figurar no pólo passivo de representações com pedido de abertura de investigação judicial eleitoral, nos termos do art. 22 da Lei Complementar no 64/90, tendo em vista o fato de a sanção imposta pela referida norma não as alcançar.”
“Não infirmados os fundamentos da decisão, impõe-se o desprovimento do agravo regimental.” (TSE, ARP - AGRAVO REGIMENTAL EM REPRESENTAÇÃO nº 1229 - Brasília/DF, Acórdão de 09/11/2006, Relator(a) Min. FRANCISCO CESAR ASFOR ROCHA, Publicação: DJ - Diário de justiça, Data 13/12/2006, Página 169) – grifei.
Manifestam-se ainda os Tribunais Regionais Eleitorais:
AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL - ALEGAÇÃO DE UTILIZAÇÃO INDEVIDA DE VEÍCULO DE COMUNICAÇÃO SOCIAL - PRELIMINARES DE CARÊNCIA DE AÇÃO E DE INCOMPETÊNCIA DO CORREGEDOR REGIONAL ELEITORAL - REJEIÇÃO - PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE PASIVA DE PESSOA JURÍDICA - ACOLHIMENTO - AUSÊNCIA DE POTENCIALIDADE DAS CONDUTAS ALEGADAS PARA INFLUIR NO RESULTADO DO PLEITO - IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO.
“Conforme precedentes jurisprudenciais, o fato do suposto abuso ter ocorrido antes mesmo da escolha de candidatos e registro de candidaturas não impede a impetração da ação de investigação judicial eleitoral.” “Preliminar de carência de ação rejeitada.”
“Com apoio em entendimento jurisprudencial, não é cabível pessoa jurídica figurar no polo passivo da demanda, uma vez que, à luz do inciso XIV da Lei das Inelegibilidades, não pode haver decretação de inelegibilidade àquela, em caso de procedência do pedido. Preliminar de ilegitimidade passiva acolhida, para excluir da lide a Rede Tropical de Comunicação.”
“Nos termos do art. 22 da Lei Complementar n.º 64/90, compete ao Corregedor Eleitoral apreciar AIJE para apurar eventual utilização indevida dos meios de comunicação. Preliminar de incompetência rejeitada.
Com apoio em entendimento jurisprudencial, não é cabível pessoa jurídica figurar no polo passivo da demanda, uma vez que, à luz do inciso XIV da Lei das Inelegibilidades, não pode haver decretação de inelegibilidade àquela, em caso de procedência do pedido. Preliminar de ilegitimidade passiva acolhida, para excluir da lide a Rede Tropical de Comunicação.” (TJ/RN, AIJE - AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL nº 123 - natal/RN, Acórdão nº 123 de 06/12/2007, Relator(a) EXPEDITO FERREIRA DE SOUZA, DJ - Diário de justiça, Data 17/01/2008, Página 01)
Desta feita, mister se faz o julgamento sem resolução do mérito da presente ação, reconhecendo-se a ilegitimidade passiva ad causam do investigado Jornal Cacerense.
Quanto ao mérito, cuida-se de ação de investigação judicial eleitoral ofertada em desfavor da Coligação “Cáceres rumo ao desenvolvimento”, Francis Maris Cruz, Antônia Eliene Liberato Dias e João Arruda pela suposta prática de abuso de poder econômico e uso indevido dos meios de comunicação social, sob o argumento de que referido jornal publicou na edição nº605 – Ano VII, matérias em destaque, denegrindo a imagem da Coligação “O futuro começa agora” e do candidato Leonardo Albuquerque Ribeiro, ao fazer alusão ao envolvimento dos representantes no trágico acidente ocorrido nesta cidade e que vitimou Sophia Leite e Jaqueline Sant’Anna.
Afirma a inicial que o jornal Cacerense, além de denegrir frontalmente a campanha do candidato Leonardo Albuquerque Ribeiro, realizou publicação extemporânea do periódico e distribuiu gratuitamente milhares de exemplares do jornal pelos bairros de nossa cidade.
Ressai do periódico colacionado aos autos, que o jornal Cacerense publicou em destaque a reportagem principal “Cinegrafista da campanha de Leonardo atropela duas pessoas. Sophia morre, Jaqueline segue em estado grave”. Seguem à chamada inicial os seguintes dizeres:
“O cinegrafista José Ferreira, 46 anos, que trabalha na campanha da coligação “O Futuro Começa Agora”, que tem como candidato o médico Leonardo Albuquerque Ribeiro atropelou na manhã de Sábado (29) as amigas Sophia Leite, 49 anos, que morreu logo após chegar ao hospital e Jaqueline Sant’Anna, 45 anos, que segue internada em estado grave na UTI (Unidade de Terapia Intensiva) do Hospital São Mateus, em Cuiabá. O motorista, que não tinha habilitação, já deixou a cadeia depois de pagar fiança (fls. 15).
A chamada de capa faz alusão à matéria completa na página 03 do jornal, com mais informações sobre a relação entre o motorista do fatídico acidente e a Coligação “O futuro começa agora”.
Consta do jornal outras reportagens e espaços destinados à campanha municipal proporcional, tais como a dos candidatos Salmo, Dr. Felix, Celso Fanaia e Marcinho Lacerda e à campanha majoritária, da candidatura de Francis Maris Cruz, todas em conformidade com a legislação eleitoral, ou seja, a limitação por edição a anúncio de 1/8 de página de jornal padrão e ¼ de página de revista ou tablóide, de modo que, não há que se falar em irregularidade no “santinho” colacionado na folha de capa.
D’outra feita, as reportagens veiculadas envolvendo a Coligação “O futuro começa agora” e o candidato Leonardo Albuquerque Ribeiro, em relação ao acidente ocorrido uma semana antes das eleições nesta cidade possuem cunho informativo, próprio da liberdade de imprensa e das garantias inerentes à liberdade de comunicação.
Por um infortúnio do destino, o que se extrai dos fatos é que o cinegrafista da campanha “O futuro começa agora”, de fato, esteve envolvido em um acidente que atingiu fatalmente uma ciclista e feriu gravemente outra. Tal assertiva se confirma inclusive pela nota de pesar emitida pela assessoria do Dr. Leonardo publicada também na folha de capa do jornal guerreado (fls. 15).
É fato público e notório que essa ocorrência gerou intensa comoção social, eis que as vítimas se tratavam de pessoas muito conhecidas em nossa cidade e figuras extremamente populares na comunidade, de modo que, proibir aos meios de comunicação social que veiculassem reportagens envolvendo o acidente e, conseqüentemente, o real envolvimento de uma pessoa ligada à “Coligação O futuro começa agora” com o sinistro, configuraria ato de censura.
A repercussão do caso pode ser constatada pela documentação acostada às fls. 75/103, que demonstra a publicação de matérias relacionadas ao acidente nos jornais Expressão, Diário de Cáceres, Jornal Oeste, Olhar Direto, Comunicação Imparcial, PasseiAki, Nortão Notícias e Globo.com, todos sites de grande visibilidade e, inclusive, com o teor das notícias semelhantes a combatida nos autos.
É de se constatar, portanto, que o Jornal Cacerense, por meio de seu representante, ora investigado, tão somente exerceu sua faculdade e razão de existir ao noticiar fatos atuais ocorridos em Cáceres, eis que a Constituição da República lhe garante a liberdade de expressão e o exercício do direito de imprensa.
Sobre o tema, destaca-se o posicionamento do Ministro Ayres Brito, na qualidade de relator da ADI 4451: “processo eleitoral não é estado de sítio (art. 139 da CF), única fase ou momento de vida coletiva que, pela sua excepcional gravidade, a nossa Constituição toma como fato gerador de 'restrições à inviolabilidade da correspondência, ao sigilo das comunicações, à prestação de informações e à liberdade de imprensa, radiodifusão e televisão, na forma da lei' (inciso III do art. 139).”
No tocante às demais reportagens distribuídas nas páginas do periódico e que envolvem a postura da Coligação “O futuro começa agora” frente ao acidente ocorrido, cumpre ressaltar que não tendem à propaganda política, permanecendo na esfera constitucional da liberdade de expressão.
Ao apreciar matéria semelhante, o Supremo Tribunal Federal, assim se posicionou, litteris:
LIBERDADE DE INFORMAÇÃO - DIREITO DE CRÍTICA - PRERROGATIVA POLÍTICO-JURÍDICA DE ÍNDOLE CONSTITUCIONAL - MATÉRIA JORNALÍSTICA QUE EXPÕE FATOS E VEICULA OPINIÃO EM TOM DE CRÍTICA - CIRCUNSTÂNCIA QUE EXCLUI O INTUITO DE OFENDER - AS EXCLUDENTES ANÍMICAS COMO FATOR DE DESCARACTERIZAÇÃO DO “ANIMUS INJURIANDI VEL DIFFAMANDI” - AUSÊNCIA DE ILICITUDE NO COMPORTAMENTO DO PROFISSIONAL DE IMPRENSA - INOCORRÊNCIA DE ABUSO DA LIBERDADE DE MANIFESTAÇÃO DO PENSAMENTO - CARACTERIZAÇÃO, NA ESPÉCIE, DO REGULAR EXERCÍCIO DO DIREITO DE INFORMAÇÃO - O DIREITO DE CRÍTICA, QUANDO MOTIVADO POR RAZÕES DE INTERESSE COLETIVO, NÃO SE REDUZ, EM SUA EXPRESSÃO CONCRETA, À DIMENSÃO DO ABUSO DA LIBERDADE DE IMPRENSA - A QUESTÃO DA LIBERDADE DE INFORMAÇÃO (E DO DIREITO DE CRÍTICA NELA FUNDADO) EM FACE DAS FIGURAS PÚBLICAS OU NOTÓRIAS - JURISPRUDÊNCIA - DOUTRINA - RECURSO DE AGRAVO IMPROVIDO. - A liberdade de imprensa, enquanto projeção das liberdades de comunicação e de manifestação do pensamento, reveste-se de conteúdo abrangente, por compreender, dentre outras prerrogativas relevantes que lhe são inerentes, (a) o direito de informar, (b) o direito de buscar a informação, (c) o direito de opinar e (d) o direito de criticar. - A crítica jornalística, desse modo, traduz direito impregnado de qualificação constitucional, plenamente oponível aos que exercem qualquer atividade de interesse da coletividade em geral, pois o interesse social, que legitima o direito de criticar, sobrepõe-se a eventuais suscetibilidades que possam revelar as pessoas públicas ou as figuras notórias, exercentes, ou não, de cargos oficiais. - A crítica que os meios de comunicação social dirigem a pessoas públicas (e a figuras notórias), por mais dura e veemente que possa ser, deixa de sofrer, quanto ao seu concreto exercício, as limitações externas que ordinariamente resultam dos direitos de personalidade. - Não induz responsabilidade civil a publicação de matéria jornalística cujo conteúdo divulgue observações em caráter mordaz ou irônico ou, então, veicule opiniões em tom de crítica severa, dura ou, até, impiedosa, ainda mais se a pessoa, a quem tais observações forem dirigidas, ostentar a condição de figura notória ou pública, investida, ou não, de autoridade governamental, pois, em tal contexto, a liberdade de crítica qualifica-se como verdadeira excludente anímica, apta a afastar o intuito doloso de ofender. Jurisprudência. Doutrina. - O Supremo Tribunal Federal tem destacado, de modo singular, em seu magistério jurisprudencial, a necessidade de preservar-se a prática da liberdade de informação, resguardando-se, inclusive, o exercício do direito de crítica que dela emana, verdadeira “garantia institucional da opinião pública” (Vidal Serrano Nunes Júnior), por tratar-se de prerrogativa essencial que se qualifica como um dos suportes axiológicos que conferem legitimação material ao próprio regime democrático. - Mostra-se incompatível, com o pluralismo de idéias (que legitima a divergência de opiniões), a visão daqueles que pretendem negar, aos meios de comunicação social (e aos seus profissionais), o direito de buscar e de interpretar as informações, bem assim a prerrogativa de expender as críticas pertinentes. Arbitrária, desse modo, e inconciliável com a proteção constitucional da informação, a repressão à crítica jornalística, pois o Estado - inclusive seus Juízes e Tribunais - não dispõe de poder algum sobre a palavra, sobre as idéias e sobre as convicções manifestadas pelos profissionais da Imprensa, não cabendo, ainda, ao Poder Público, estabelecer padrões de conduta cuja observância implique restrição indevida aos “mass media”, que hão de ser permanentemente livres, em ordem a desempenhar, de modo pleno, o seu dever-poder de informar e de praticar, sem injustas limitações, a liberdade constitucional de comunicação e de manifestação do pensamento. Precedentes do Supremo Tribunal Federal. Jurisprudência comparada (Corte Européia de Direitos Humanos e Tribunal Constitucional Espanhol). (STF, AI 690841 AgR / SP - SÃO PAULO, AG.REG.NO AGRAVO DE INSTRUMENTO, Relator(a): Min. CELSO DE MELLO, Julgamento: 21/06/2011 Órgão Julgador: Segunda Turma, DJe-150 DIVULG 04-08-2011 PUBLIC 05-08-2011EMENT VOL-02560-03 PP-00295) – grifei.
Ainda nas discussões aventadas na inicial, destaca-se a extemporaneidade da edição e a possível distribuição gratuita da edição pelos bairros da cidade.
No que concerne à extemporaneidade da edição, ou seja, sua veiculação na quarta-feira (03/10) e não no sábado, como é de costume, logrou o representante do Jornal Cacerense, comprovar que frequentemente publica o periódico em datas diferentes do sábado, como se vê do jornal de fls. 137, publicado numa segunda-feira, do de fls. 138, publicado numa quinta-feira, no de 139, veiculado numa sexta-feira.
O mesmo ocorrendo nos jornais de fls. 140/141. Logo, a regra de ser o periódico publicado sempre no Sábado não se demonstrou absoluta.
De mais a mais, caso o jornal tenha sido publicado no Sábado, como era costumeiro, eventualmente, surpresa poderia ocorrer em relação ao pleito municipal de Domingo e sua antecipação foi, para a lisura do mesmo, de bom alvitre.
Já acerca da distribuição dos periódicos pelas ruas da cidade, embora as testemunhas Norma Piran, Wilson Kishi e Augusta Maria Cardoso tenham afirmado em audiência que teriam recebido o jornal em suas residências e ainda que pessoas teriam distribuído o periódico de forma gratuita nas ruas, afere-se que não há comprovação efetiva de que tais distribuições tenham sido realizadas de forma maciça pela cidade e ainda, como afirmado, não há qualquer informação no periódico que possua conotação de propaganda negativa ao candidato Dr. Leonardo, a não ser o fato do acidente que envolveu o cinegrafista que participou na campanha deste.
Depois, como já mencionado, as reportagens veiculadas foram também divulgadas em outros meios de comunicação com o mesmo teor, como observou, de forma escorreita, o ilustre representante do Ministério Público Eleitoral, Doutor Samuel Frungilo, verbis:
“Inobstante algumas testemunhas tenham confirmado a distribuição gratuita do jornal para não assinantes, não vislumbro potencialidade lesiva na conduta em comento que fosse apta a comprometer a normalidade e legitimidade da eleição, já que a notícia acerca do atropelamento foi amplamente comentada pelos munícipes e divulgada por todos os meios disponíveis (TV, rádio, sites de notícias e relacionamento), tendo chegado ao conhecimento da população independentemente da edição guerreada.” (fls. 150)
Destaca-se, neste ponto, que o periódico possui vários assinantes e é distribuído por toda a região, de modo que sua veiculação nesta cidade não possui gravidade suficiente a abarcar a circunstância constante do art. 22, XVI, da Lei Complementar 64/90.
Desta feita, não se verifica a ocorrência do uso indevido dos meios de comunicação social, uma vez que as reportagens guerreadas são frutos da liberdade de imprensa e de informação.
Importa salientar, por fim, que os debates trazidos na presente AIJE, voltados à declaração de inelegibilidade dos investigados comportaram ampla discussão de parte a parte, onde foi necessária a observação da ampla defesa e do contraditório, o que afasta, totalmente, a lide a ser acusada de temerária ou manifesta má-fé.
Logo, por esta razão, deixo de aplicar as sanções do art. 25 da Lei Complementar 64/90, em desfavor do representante.
Com essas considerações, em sintonia com o parecer ministerial, julgo IMPROCEDENTE o pedido feito na presente ação de investigação, com a resolução do seu mérito, nos termos do art. 269, I, do CPC.
Ciência às partes e ao representante do Ministério Público Eleitoral.
Transitada em julgado, arquive-se com as baixas e cautelas de praxe.
P.R.I.C.
Cáceres, 19 de novembro de 2012.
Geraldo Fernandes Fidelis Neto
Juiz Eleitoral da 6ª ZE