O médico veterinário Paul Raad, que há três anos atua no Pantanal com monitoramento de onças-pintadas, afirmou que os pantaneiros não devem ser responsabilizados isoladamente pelas queimadas que atingem o bioma nos últimos anos. Em entrevista ao PodOlhar, o pesquisador apontou que a degradação ambiental observada na região tem múltiplas causas e alertou que o Pantanal está cada vez mais vulnerável ao fogo.
“Acontece por vários fatores. Tem muitas pessoas que são turistas, que jogam cigarro aceso. Tem propriedades abandonadas. Está mais seco. É como uma pólvora”, disse Raad. “As pessoas jogam muito a culpa no pantaneiro, mas eles não têm a culpa”.
Desde 2020, o Pantanal enfrenta uma série de incêndios de grandes proporções, com recordes sucessivos de áreas queimadas. Em 2024, segundo dados preliminares citados por Raad, cerca de 18% do território pantaneiro foi atingido pelo fogo. Para o pesquisador, as mudanças climáticas, a redução das chuvas e atividades humanas diversas estão entre os principais fatores que tornam o bioma mais suscetível.
“Na minha curta vida de 35 anos, eu não via essa fumaça na televisão. Claramente está acontecendo algo. Por que tem mais fumaça? As pessoas jogam fogo? Pode ser. Cabos de eletricidade? Raios? Tem muitos fatores”, afirmou.
Coordenador de um projeto de monitoramento na região da Pousada Piuval, em Poconé (MT), Raad destacou que, apesar dos desafios, o Pantanal ainda abriga a população de onças-pintadas considerada mais densa do país. Ele relatou que, embora também haja mortalidade desses felinos por retaliação em conflitos com a pecuária, a região oferece recursos naturais suficientes para sustentar a espécie.
“O Pantanal é uma esperança. É o bioma mais biodiverso do mundo. Tem muita comida para a onça-pintada”, afirmou. “Mesmo com os incêndios, o alagamento por seis meses ainda protege o animal, porque limita o acesso das pessoas, e a onça consegue se refugiar.”
Segundo o pesquisador, o caminho para a conservação passa pela busca de equilíbrio entre a fauna silvestre e as comunidades humanas. “A onça-pintada, para alguns, é uma ameaça à economia. Eu entendo os dois lados. Nosso trabalho é tentar encontrar um ponto de coexistência. Não gerar guerra com a onça nem com as pessoas.”
Raad também ressaltou que, embora ações de prevenção possam mitigar os impactos dos incêndios, os focos de calor só cessam com a chegada das chuvas, que têm se tornado cada vez mais tardias. “Até não chegar a chuva — e às vezes ela não chega até novembro — milhões de hectares são perdidos por fogo. Podemos fazer campanhas, mas não conseguimos apagar tudo.”