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Casa que nasci
Por por Guilherme Vargas
13/07/2020 - 14:47

Foto: arquivo pessoal
Uma casa em estilo colonial, com beira, mas sem platibanda. Essa foi a casa que nasci... ou melhor, a casa que minha família morava quando nasci. Você lembra a casa que sua família morava quando você nasceu?
Como a maioria das casas coloniais, a que eu nasci tinha um corredor que ligava o primeiro ao último cômodo, com a cozinha e o banheiro no final, também haviam elementos vazados para ligar ao quintal. Morava ali porque era próximo dos meus avós, tios, primos. Ter a família por perto pode significar uma segurança inestimável.
De lá, era fácil ir ao Miura; ao Jumbo Eletro, ao supermercado Pão de Açúcar, que não existe mais; a praça da feira. A vista mais marcante da porta da casa era uma árvore linda, no terreno baldio da frente: um louro-branco, ou como a gente chamava: flor de helicóptero. A rua ficava toda tomada de flores brancas e marrons, secas e farfalhantes, como o cerrado é nesta parte do Pantanal... Flores que caiam girando, bailando, como hélices de helicóptero. Um dia a árvore pegou fogo e se foi dali. Fomo nós também embora para o bairro mais longínquo, pegando a enlameada Avenida Tancredo Neves e moro aqui até hoje... desde 1989.
Construíram alguns prédios no terreno do louro branco, a academia famosa pela piscina aquecida está lá. Clínica médica, escritório de contabilidade, de advocacia, um cartório... tudo isso faz parte da realidade da vizinhança da casa colonial em que morávamos. Ah, sim, bem próximo também fica a praça da feira, com suas barracas de salgados 24h, sempre salvando principalmente quem saía do Balderrama depois das 4h da madrugada.
O Balderrama foi um lugar único, idealizado por Carlos Alberto Maldonado, professor, reitor da Unemat, e ficava ali, na casa da família dele, bem próximo à casa onde nasci. Tanta coisa boa vivida lá e tanta gente interessante que convivi. Uma dessas pessoas é Henrique Maluf. Cantava músicas incríveis, entre samba e MPB; eu sempre pedia Canto de Ossanha.
Henrique tem carreira de destaque na música. Cacerense das urbanidades, referência de uma geração consistente na Cultura de Mato Grosso. Uma geração de gente muito inteligente, desenvolvida no fosfato dos peixes do rio Paraguai. Graduado em Música na UFMT, professor de artes do minicípio de Cuiabá, Henrique sempre tinha alguma apresentação para fazer aqui em Cáceres. É claro que eu estava em todas; era sempre dos mais animados, ao ponto dele pedir para eu ter um pouco de calma... hehehhe... algumas vezes perguntaram se éramos irmãos, inclusive para o pai dele, o prof. (Vitérico) Maluf. Dois gordos, barbudos, apesar de eu ser um bocado mais baixo. A gente reconhece nossas semelhanças.
Um dia vendo no Instagram as artes do Caetano Meloso, o cão labrador de Henrique, reconheci algumas coisas. Sabia que ele estava passando o isolamento social entre a casa da mãe e do pai. Como eu conhecia a casa do pai dele, resolvi questionar quando ao local que ele estava. Quase o irritei com tanta pergunta, rodeando para ter certeza do local. Afinal, aí é a casa da sua mãe? -Sim! - respondeu ele. -POIS ESSA É A CASA QUE EU NASCI!
Há, mundo de coincidências! Vidas de cacerenses sempre se entrelaçam. Mais de 30.000 domicílios e aquela casa em estilo colonial. Continua lá o mesmo piso de quadrados amarelos e vermelhos, que era difícil de encerar, mesmo com escovão e enceradeira. Alguns espaços reformados, mas muita coisa ainda que se mantem. D. Chica, mãe de Henrique, faz um bolo de queijo com erva doce delicioso, perfeito para ser acompanhado de "café num copo de extrato de tomate". Hoje a sala com porta e janela em abas é a cantina de D. Chica e lá tem para vender do delicioso bolo de queijo.
Foram muitas lembranças dessa casa... a janela baixa, de onde se tentou voar como o Shazan fez meu irmão quebrar o braço; a grade tempestade de 1987; o quarto de madeira no fundo, onde hoje só se vê o alicerce que acomoda os apetrechos de oficina de marcenaria de Henrique.
Uma casa colonial, de paredes grossas, portais de madeira. A casa que nasci, onde mora o cara que admiro tanto e que parece ser meu irmão. Dos 6 anos que lá morei, dos mais de 15 anos que Henrique convive por lá, eternizou-se a casa da rua General Osório.
 
Por Gilherme Vargas
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