A Justiça de Mato Grosso decretou a indisponibilidade de bens de 10 réus de um suposto esquema de pagamentos de notas fiscais frias, por serviços que não foram prestados, e que envolvem empresas fantasmas. As fraudes ocorreram em convênios da Faespe, Fundação ligada à Universidade do Estado de Mato Grosso (Unemat), com o Tribunal de Contas do Estado (TCE-MT), e a Assembleia Legislativa de Mato Grosso (ALMT).
De acordo com a decisão da juíza Célia Regina Vidotti, da Vara Especializada de Ação Civil Pública e Ação Popular, foram bloqueados R$ 277,6 mil de Marcos José da Silva, Jocilene Rodrigues Assunção, Luiz Benvenutti Castelo Branco de Oliveira, Marcos Antonio de Souza e Elizabeth Aparecida Ugolini. O suposto esquema foi identificado após a operação “Convescote”, deflagrada pelo Grupo de Atuação Especial Contra o Crime Organizado (Gaeco) no ano de 2017.
Também foram bloqueados os bens de Lazaro Romualdo Gonçalves de Amorim (R$ 49,4 mil), Marcelo Catalano Correa (R$ 38,8 mil), Nerci Adriano Denardi (R$ 11,8 mil), Odenil Rodrigues de Almeida (R$ 11,9 mil) e de Sued Luz (R$ 155,6 mil).
De acordo com informações do processo, o suposto esquema teria como líderes Marcos José da Silva – que à época das fraudes, entre 2015 e 2016, ocupava o cargo de Secretário-Executivo de Administração do TCE-MT -, e sua esposa, “representante” da Faespe, Jocilene Rodrigues de Assunção. Eles se aliaram a Carlos Roberto Borges Sassioto para realizar as fraudes. Ele era trabalhador terceirizado do setor de tecnologia da informação do TCE-MT.
“Os requeridos Marcos, Jocilene e Carlos, aproveitando das funções que exerciam nas referidas instituições – TCE/MT; FAESPE e ALMT - cooptaram várias pessoas para que, mediante a criação de empresas de fachada, desviassem recursos públicos por meio de fraudes em convênios firmados pela FAESPE”, diz trecho da denúncia, que continua.
“Entretanto, constatou-se que nunca houve a prestação de serviços; os relatórios de atividades e as notas fiscais apresentadas continham informações inidôneas e os pagamentos realizados pelo poder público eram apropriados e divididos entre os integrantes do esquema, notadamente os mentores Marcos Jose da Silva e Jocilene Rodrigues de Assunção além dos proprietários de cada pessoa jurídica de fachada”, revelam ainda os autos.
Os bloqueios dos bens foram determinados após identificação de fraude em dois convênios firmados entre a Faespe, e o TCE-MT, no valor de R$ 98,1 mil , e também a ALMT, que pagou R$ 179,4 mil. Um dos réus, Luiz Benvenuti Castelo Branco de Oliveira, utilizou uma empresa de fachada, a pedido dos líderes do esquema, para emitir notas fiscais frias pelos serviços de “apoio administrativo” – que não foram realizados. Os autos informam que ele tinha um “acordo” com Marcos José da Silva, e ficava com 12% dos valores das notas frias que eram emitidas.
EMPRESAS FANTASMAS
A denúncia do MPMT dá detalhes da participação de cada um dos réus que estariam por trás da suposta fraude.
Marcos Antônio de Souza é proprietário de um escritório de contabilidade e foi procurado por Jocilene Rodrigues para “abrir” uma empresa, além de ter “encaminhado” outras pessoas para a abertura de outras organizações – todas fantasmas. O contador também ficou responsável pelos “serviços contábeis dessas empresas, bem como a elaboração de processos de prestação de contas.
Já Lazaro Amorim trabalhava para a Faespe e também abriu uma empresa de fachada a pedido de Jocilene. O contrato com a Fundação tinha o objetivo de prestar “assessoria financeira e administrativa” na gestão de convênios da ALMT, no TCE-MT, na Secretaria de Estado de Infraestrutura (Sinfra-MT), e até mesmo na prefeitura de Rondonópolis (216 KM de Cuiabá).
Marcelo Catalano, por sua vez, é servidor efetivo do TCE-MT e ocupa o cargo de técnico público de controle externo. Nos anos de 2014 e 2015 ele integrou uma comissão para “acompanhamento dos convênios da FAESPE, responsável por fazer a conferência formal dos serviços executados”.
A denúncia segue descrevendo a atuação dos demais réus no esquema de fraudes revelado na operação “Convescote”. Odenil de Almeida, por exemplo, é servidor comissionado da ALMT e atestava a prestação de serviços – que, na verdade, não eram feitos. O Gaeco aponta que ele seria o elo com o deputado estadual Ondanir Bortolini, o “Nininho” (PSD), além do então parlamentar Guilherme Maluf – hoje presidente do TCE-MT.
“O requerido Odenil de Almeida, em seu depoimento, relatou que é servidor comissionado da Assembleia Legislativa de Mato Grosso há mais de dez anos e, nos anos de 2015 e 2016 ocupou o cargo de secretário de serviços legislativos [...] Afirma que a requerida Jocilene o procurou, se identificando como funcionaria da FAESPE e apresentou relatórios para que o requerido atestasse a prestação dos serviços, o que fez, mediante previa autorização dos deputados estaduais Guilherme Maluf e Nininho”, revelam os autos.
Na mesma linha, Nerci Adriano Denardi, e Sued Luz, também atestavam os serviços feitos por “empresas fantasmas”. Por fim, Elizabeth Ugolini, seria uma “facilitadora” do esquema nas movimentações financeiras no banco onde trabalhava, o Sicoob.
BLOQUEIO
Na decisão, o Poder Judiciário Estadual ponderou que alguns dos réus não deveriam responder, ou sofrer o mesmo bloqueio de bens, dos líderes da fraude.
“Em relação aos requeridos Lazaro Amorim, Marcelo Catalano, Nerci Denardi, Odenil de Almeida e Sued Luz, não há nos autos indícios suficientes que tenham participado ou de qualquer forma contribuído com todos os atos que culminaram com o desvio do referido montante, ou que dele tivessem se beneficiado”, diz trecho da decisão do dia 25 deste mês.
Já em relação aos outros réus, a decisão não poupou o bloqueio de bens, que atingiu de forma “solidária” os demais envolvidos na fraude.
“Em relação aos demais requeridos, há indícios suficientes que a atuação de cada um contribuiu decisivamente para que o montante de R$ 277.594,23 fosse dilapidado dos cofres estaduais, o que autoriza, neste momento processual, a aplicação da solidariedade quanto a responsabilidade pelo ressarcimento do dano”, pondera a juíza Célia Vidotti.
A decretação de indisponibilidade não significa a condenação, nem o fim do processo, e é uma medida de praxe em ações na Justiça que identificam eventuais prejuízos aos cofres públicos. Os autos continuam tramitando no Poder Judiciário Estadual.