No contexto da Pandemia Covid -19, escolas e governos em todo o Brasil têm apontado como alternativa para o funcionamento dos sistemas educacionais a adoção do ensino híbrido. Afinal, o que seria esse ensino? No artigo de opinião intitulado “Teremos ensino híbrido em 2021? o professor do Instituto Federal de Mato Grosso, IFMT Campus Cáceres - Prof. Olegário Baldo, Milson Evaldo Serafim contextualiza o conceito de ensino híbrido e alerta para distorções no uso do termo.
No texto publicado em veículos de comunicação on-line, o professor explica que a proposta de realizar um ensino alternado que combina aulas presenciais com aulas remotas não é ensino híbrido. Ele se baseia em estudiosos do tema para afirmar que este modelo de ensino caracteriza-se por base organizacional específica em que o estudante é o centro do processo de ensino-aprendizagem.
“No ensino híbrido, a centralidade é do aluno. A personalização do ensino é base, respeita-se a forma de aprender do estudante e um mesmo tema pode ser aprendido de maneiras diferentes com fontes de conteúdo diferentes. O conceito de turmas organizadas por idade, por tempo na escola deixa de ser a base organizacional, pois o momento em que cada aluno está pronto para iniciar um novo tema é diferente”, destaca o professor.
De acordo com Milson é importante observar as mudanças e experiências educacionais que ocorrem no decorrer da pandemia para avançar em um modelo que "oportunize aos estudantes aprender as habilidades requeridas no Século XXI. Só não devemos nos apropriar de um nome, que remete a algo que ainda não experimentamos”, considera o professor.
O artigo:
Teremos ensino híbrido em 2021?
Até bem pouco tempo, raras exceções, todos concordavam que lugar de criança era na escola. Se voltarmos uma ou duas décadas diriam ainda que lugar de estudar é na escola. Começou a pandemia da Covid-19 e as coisas fugiram da normalidade.
Pais, estudantes, professores e profissionais ligados ao ensino tiveram que buscar alternativas para manter o ensino diante das limitações de convívio que a pandemia nos meteu.
Aquilo que chamávamos simplesmente ensino precisou ser adjetivado para se diferenciar das novas propostas de ensino durante o período da pandemia.
Ensino tradicional, ensino presencial, ensino na escola... em substituição, veio o ensino remoto com suas inúmeras variações.
Aprendemos a falar ensino remoto com aulas síncronas ou aulas assíncronas, se fossem programas de tv diríamos, simplesmente, programa ao vivo e programa gravado.
Aqui vale acrescentar uma informação, já que à primeira vista o ensino remoto não parece algo novo, pois no ensino superior brasileiro já temos bem consolidada a modalidade EaD (ensino a distância). Não é a mesma coisa.
A EaD pressupõe a existência de um ambiente virtual de aprendizagem (AVA), com horário de acesso flexível, já o ensino remoto, no contexto que estamos tratando aqui seria uma tentativa de reproduzir as aulas presenciais, utilizando plataformas de streaming, ou, em uma terminologia do momento, tecnologias da informação e da comunicação (TICs).
O professor ministra sua aula (síncrona ou assíncrona), próximo do que faria se fosse presencial, ou envia apostilas quando o estudante não dispõe do aparato para este tipo de aula.
O ensino híbrido é diferente do ensino remoto e da EaD. No ensino híbrido o estudante é o centro do processo.
Na definição de Lilian Bacich, uma referência deste tema no Brasil, "o Ensino Híbrido tem como foco a personalização, considerando que os recursos digitais são meios para que o estudante aprenda, em seu ritmo e tempo, que possa ter um papel protagonista e que, portanto, esteja no centro do processo".
A sala de aula tradicional pressupõe que todos aprendem da mesma maneira, pois a mesma aula é ministrada para 30, 40 ou até mais alunos de uma só vez.
No livro "Você, seu Filho e a Escola: Trilhando o Caminho para a Melhor Educação", o autor Ken Robinson remonta este modelo ao período da revolução industrial, no século XIX, por razões de desenvolvimento econômico, os governos precisavam "formatar" (dar forma) a sua força de trabalho, pois uma força de trabalho "bem educada" era vital para o crescimento da economia industrial. Daí o modelo de sala de aula atual foi o mais adequado.
Este modelo foi consolidado na expansão da educação pública, para atender objetivos de formatação social e cultural. Aqui, nesta sala de aula, o professor é o centro.
No ensino híbrido, a centralidade é do aluno. A personalização do ensino é base, respeita-se a forma de aprender do estudante e um mesmo tema pode ser aprendido de maneiras diferentes com fontes de conteúdo diferentes.
O conceito de turmas organizadas por idade, por tempo na escola deixa de ser a base organizacional, pois o momento em que cada aluno está pronto para iniciar um novo tema é diferente.
No ensino híbrido o estudante tem autonomia dentro de seu itinerário formativo. Ao menos uma parte do que será estudado é o aluno que escolhe segundo seu interesse.
É demasiadamente restrito chamar um ensino alternado, que combina aulas presenciais e aulas remotas como ensino híbrido.
O autor Michael Horn, no livro "Blended: usando a inovação disruptiva para inovar a educação" alerta para o uso inadequado do termo ensino híbrido, como por exemplo, quando governos começaram equipar salas de aulas com dispositivos e programas de computador e chamar isto de ensino híbrido.
O ensino híbrido depende do uso das TICs. Plataformas como Kham Academy, com mais de 100 milhões de usuários ao redor do mundo, e tantas outras, especialmente aquelas que dão feedback em tempo real do desempenho do aluno durante seu estudo online, são importantes.
Porém, o ensino híbrido pode começar bem mais simples, quebrando a disposição em fileiras das cadeiras e criando um círculo que torna o aluno ativo no processo de aprendizagem.
Podemos usar as mudanças que aconteceram em decorrência da pandemia e as experiências adquiridas com as TICs e com o ensino remoto para discutirmos um modelo de ensino híbrido, se desejamos avançar para o ensino híbrido ou para outro modelo que oportunize aos estudantes aprender as habilidades requeridas no Século XXI. Só não devemos nos apropriar de um nome, que remete a algo que ainda não experimentamos.
É professor do IFMT Cáceres, engenheiro agrônomo, mestrado em agronomia e doutorado em ciência do solo.