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Há 26 anos excessos em treinamento mataram dois cadetes da PM em Cáceres
Por João Arruda
04/04/2024 - 15:04

Foto: ilustrativa

Era madrugada de outono dia 04 de abril de 1998, o correspondente da Folha do Estado, (já extinto), foi acionado.

A denúncia preliminar informava que um dos 33 cadetes da Academia da Polícia Militar de Mato Grosso,  havia se afogado no turvo Rio Padre Inácio,  área rural de Cáceres  - a 210 quilômetros Oeste de Cuiabá - mas a tragédia era maior ainda. 

O planejamento do Comando da Academia Costa Verde,  onde formam os oficiais da PM, havia se deslocado desde sua sede em Várzea Grande,  área metropolitana da capital, com objetivo de adestrar à tropa na região Oeste,  apontada tanto como estratégica quanto complexa. A fronteira. 

Sob o comando do coronel Celso Benedito,  os alunos chegaram à cidade na sexta feira  02, daquele fatídico ano de 98.

Um efetivo de futuros oficiais num total de 33, foram recepcionados pelo então comandante regional Zuzi Alves Filho.

Noutro dia, seguiram para aula de reconhecimento da extensa área que faz limite entre o território mato grossense e a República da Bolívia. 

Às instruções foram exaustivas incluindo ações com emprego de gás lacrimogêneo,  bombas de efeito moral. 
 

AVIÃO CAÍDO 

Nesse " Teatro de Operações " os oficiais instrutores,  internaram todos os 33 alunos no interior da fuselagem de um DC 10, Cargueiro da Força Aérea Boliviana,  abandonado em solo brasileiro,  desde meados da década 1960, quando de pane elétrica, não sendo resgatado. 

Todos os cadetes prensados como sardinhas em latas, as portas e escotilhas foram vedadas com vegetação,  enquanto no lado externo os monitores davam açoites na fuselagem, enfurecendo as vespas vinagres de suas colmeias impregnadas no teto da aeronave. 

Sob dolorosas ferroadas dos marimbondos,  os alunos submetidos a suportar o castigo por mais de 30 minutos,  quando então um a um foram evacuados do cargueiro boliviano. 

A sequência dos treinamentos " extra grade curricular " por obsessão dos oficiais incluiu rastejo dos subordinados em lagoas fetidas, povoadas por jacarés e serpentes,  sob o falso "escopo " de forjar excelentes oficiais. 

Cai a noite,  o insano treinamento cede um breve arrego à combalida tropa. 

As viaturas de transporte seguem até à margem esquerda da Rodovia Federal 174, na localidade batizada de Pedro Neca. Lá reencontram com os oficiais superiores Celso Benedito e Zuzi Alves,  fazem uma breve refeição;  o comando então orienta que regressem à Cáceres,  fechando o ciclo a campo na fronteira. 

Quando os dois comandantes se afastam os monitores compram barras de gelo,  entram no veículo de transporte que traria o efetivo à Cáceres. 

A ordem dada não foi cumprida,  a bordo aqueles que exaustos estavam  cochilando,  foram obrigados a segurar no colo barra de gelo. 

Já passa da meia noite daquele domingo dia 04, quando novamente os carros são parados.  Desta feita a margem direita do profundo Córrego Padre Inácio.

Lá os 33 alunos são obrigados a nadarem fardados inclusive com coturnos,  de uma margem à outra. 
 

Até que o aluno oriundo do estado de Pernambuco Evaldo Bezerra de Queiroz,  com voz embargada clama ao seu comandante " tenente,  tenente estou afogando", e desaparece nas correntezas do Padre Inácio . 

Solidário ao campanheiro, outro  aluno, franzino, " Sérgio Kabayashi " se atira para socorrer o irmão,  mas também é tragado pelas turvas do riacho. 

Então,  iniciam às buscas ao Evaldo Bezerra. Nem a tropa e tampouco os cadetes naquela escuridão sequer percebem que Kobayashi  seria a segunda vítima. 

Com os primeiros raios solares despontando,  eis que localizam Bezerra, trazendo seu cadáver para o Instituto Médico Legal ( IML).

O sumiço de Kobayashi,  é notado já na certificação de presença,  quando no pátio externo da PM de Cáceres,  é feita a chamada sem resposta,  uma vez que corpo jazia preso a uma cerca de arame farpado,  enquanto pequenos peixes lhes impunham mordidas à face. 

Resgatado,  já ao amanhecer,  é levado sem vida para se postar ao lado do seu amigo  Bezerra  no cálido mármore . 

A esta altura a imprensa local e da Capital, já se fazia presente,  embora alguns oficiais instrutores ensaiavam intimidações,  sem êxito. 

Os alunos em formatura militar,  não continham em lágrimas pela perda dos dois irmãos de farda. 

Passados 26 anos,  o estado de Mato Grosso,  a Polícia Militar,  não puniu nenhum dos responsáveis,  ao contrário galgaram seus postos degrau à degrau, como um IPM, estilo " padre de festa junina "  enquanto as vítimas encerraram seus sonhos,  por excessos , abusos,  torturas,  que ao que parece neste estado se consolida como uma referência assombrosa em assassinar seus alunos das escolas de Formação, daqueles que desde muito jovem sonham numa carreira, numa das mais antigas respeitadas instituição de segurança pública do país. Com inaceitável frequência os castigos de maneira crônica enoldam a PMMT.

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