Pintos e periquitas
Por por Caroline Rodrigues
15/10/2013 - 13:13
O projeto “Pinto Feliz” gerou polêmica na Câmara de Vereadores de Cuiabá e trouxe à tona uma temática interessante e que precisa ser discutida pelo setor de saúde pública, a atividade sexual na terceira idade. A proposta, apresentada na semana passada pelo vereador Mário Nadaf, estava nas conversinhas e era alvo de piadinhas nos corredores.
Alguns ficaram desconfortáveis com o tema, porém a distribuição de remédios para disfunção erétil nos postos de saúde não é novidade em Mato Grosso.
No ano de 2006, a Prefeitura Municipal de Santo Antônio do Leste implantou uma lei semelhante, apelidada de “Pinto Alegre”. Em menos de seis meses, ela foi cassada porque além dos altos gastos com medicamentos e especialistas, era exclusiva e não inclusiva, como defendiam os políticos.
O pior é que se a lei de Cuiabá for aprovada, tende a não durar muito tempo porque tem a mesma falha. O projeto faz a inserção apenas dos idosos homens e descarta as mulheres, como se elas não tivessem a ganhar tendo uma vida sexual ativa.
Em Santo Antônio do Leste, as mulheres, eleitoras e vítimas da lei reclamavam do aumento da traição e do fim das famílias. Mais dispostos, os idosos queriam estar nas festas e namorar muito.
As companheiras deles também queriam, mas como acontece com várias idosas, eram barradas por questões emocionais e hormonais, que também podem ser evitadas com remédios e terapia.
O problema é que o Sistema Único de Saúde (SUS), que teoricamente é universal, tinha algo a oferecer para tratar a disfunção erétil. A mulher, apesar de não precisar colocar nada em pé, tem outras necessidades para se manter ativa e não existia na cidade remédios para elas.
Li em um artigo do geriatra Norton Sayed, que tem vários livros direcionados a doenças na terceira idade e já foi presidente da Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia. Ele explica que a mulher idosa passa a ter obstáculos físicos e psicológicos para o desenvolvimento da vida sexual.
No âmbito físico, estão as doenças que prejudicam a mobilidade, como artroses e osteoporose, além das cardíacas. Outra questão é a diminuição do libido, que acontece devido às mudanças hormonais. Em alguns casos, há ainda alterações vaginais como secura e estreitamento do canal.
Com relação às questões psicológicas, está falta de afeto, informações e diálogo com o parceiro. Também estão na lista de dificuldades os fatores culturais, que impedem a idosa de buscar ajuda e até mesmo de falar sobre o assunto.
Então, os políticos devem pensar que de nada adianta ter um pinto feliz se a periquita está triste.
Os benefícios da atividade sexual estão comprovados, mas caso seja disponibilizado um departamento apenas para o assunto, as mulheres devem ser inclusas. Assim, a lei atenderá como se deve o público e ainda promoverá o fortalecimento da família.
Não é apenas o pinto que precisa de qualidade de vida.
CAROLINE RODRIGUES é editora de política do jornal Diário de Cuiabá