Acupuntura:'As transgressões das emoções são o fator de adoecimento'
Por Débora Siqueira/Midianews
17/11/2013 - 12:47
Foto: Pedro Alves/MidiaNews
A primeira coisa que o médico acupuntor Alípio César dos Santos faz, durante o atendimento, é sentir, com as pontas dos dedos, a pulsação de seus pacientes. Por meio dessa técnica, ele percebe, pelo pulso, a quantas andam a "energia vital" da pessoa.
Formado pela tradicional Escola Paulista de Medicina, em São Paulo, e com especialização na China, Alípio trocou, há 25 anos, a medicina tradicional (ocidental) pela Medicina Tradicional Chinesa. E se transformou na principal referência no atendimento por meio da acupuntura, em Cuiabá.
Com um diagnóstico diferenciado, que "mede" a energia vital do paciente, a técnica consiste em atacar a causa da doença, e não o efeito.
"Dentro do diagnóstico energético, há a concepção de que a doença nasceu na energia e está expressa numa fase invisível. Quando você aborda o paciente, procura entender o que está acontecendo dentro do seu campo energético, o porquê dele estar desenvolvendo a patologia. Ninguém dorme 100% bom e acorda 100% canceroso. A manifestação orgânica, física, das doenças que a gente rotula por um nome, uma TPM, uma constipação, nunca aconteceu do dia para a noite. Ela teve fases: a silenciosa, que cabe à investigação da Medicina Tradicional Chinesa e, depois, a sintomática", afirmou.
Em entrevista ao MidiaNews, Alípio dos Santos explica como funciona sua técnica, quais os principais males que causam o desequilíbrio, atualmente, nos ser-humano, e como se precaver das doenças.
"Você já ouviu falar naquela máxima de que tudo o que eu gosto é ilegal, é imoral ou engorda? É isso o que estamos vivendo. O ser humano é movido pelo prazer sexual, da palatinidade. As indústrias querem te pegar pelo prazer. Os alimentos de hoje utilizam componentes "alienígenas" que não fazem parte da sua composição biomolecular. É como se você estivesse dormindo com o inimigo, no café da manhã, almoço, jantar, ceia ao longo de décadas, de anos. O que você acha que vai acontecer? Você vai enferrujar suas engrenagens", explica.
Confira os principais trechos da entrevista:
MidiaNews – Qual a filosofia, o conceito da acupuntura?
Alípio – A acupuntura é uma técnica de tratamento. Ela, em si não é nada, pois ela está inserida em de um contexto da medicina tradicional chinesa, que é uma filosofia de tratamento funcional. A acupuntura é um recurso utilizado dentro dos vários recursos que a medicina chinesa dispõe.
MidiaNews – Como ela funciona?
Alípio – Tudo passa por um diagnóstico de exatidão, de precisão em relação à filosofia da medicina tradicional chinesa, que difere muito da diagnose da medicina ocidental. O diagnóstico da medicina tradicional chinesa se baseia em critérios energéticos funcionais, e não em análise laboratorial. É mais a respeito de método próprio e especial com propedêutica e semiologia médica diferente do que aprendemos nas nossas faculdades de medicina.
MidiaNews – A acupuntura é uma alternativa à medicina tradicional?
Alípio – Eu não diria que seria uma alternativa, eu diria que seria um complemento interessante, porque atuam de forma a potencializar os efeitos em níveis de acontecimentos sucessivos. Dentro da concepção da medicina tradicional chinesa, as doenças e as manifestações das doenças ocorrem ainda no nível que antecedem as manifestações físicas das doenças. Então, quando você está abordando o paciente, você procura entender o que está acontecendo dentro do campo da energia daquele paciente para que ela possa desenvolver, ou já tenha desenvolvimento, a patologia. Ninguém dorme 100% bom e acorda 100% canceroso. A manifestação orgânica, física das doenças que a gente rotula por um nome, uma TPM, uma constipação, nunca aconteceu do dia para a noite. Ela teve fases: a silenciosa, que cabe a investigação da medicina tradicional chinesa e, depois, a sintomática.
MidiaNews – Todas as doenças podem ser tratadas com as agulhas?
Alípio – Dentro do diagnóstico energético, há a concepção de que a doença nasceu na energia e está expressa numa fase invisível. Mas, a partir do momento que o rótulo que a doença tem, aqui no ocidente, e se instalou fisicamente, de forma palpável, pode ser mensurada e detectada a partir de exames complementares, não é só uma doença energética funcional, mas se instalou em outro nível. Você tem dois níveis, duas fases de evolução, porque a patologia é dinâmica, tem a fase invisível e a que está em andamento.
MidiaNews - Como a técnica da acupuntura foi desenvolvida?
Alípio – A história da acupuntura, da medicina chinesa, datam de cinco mil anos atrás. Na verdade, a acupuntura não é privilégio da cultura chinesa, mas da cultura oriental, e é praticada em países como Japão, Vietnã e Coreia. É uma filosofia muito mais imaterial, mas espiritual, e aborda o homem com um ser da natureza, regido sob as leis da natureza que se expressam na saúde ou na doença.
MidiaNews – Como o senhor, formado pela tradicional Escola Paulista de Medicina, se interessou e decidiu seguir nesta área?
Alípio – Pela minha formação original, eu sou cirurgião. Na época em que eu fazia residência, meu professor vinha desenvolvendo a acupuntura na faculdade. Comecei a me interessar quando o acompanhava na evolução dos pacientes. Ele era ortopedista e chefe do departamento, e fazia o pós-operatório de seus pacientes - analgesia e, às vezes, o pré-operatório para que eles tivessem um preparo de vitalidade para a o procedimento. E a acupuntura mobiliza essa energia vital. A energia é algo muito subjetivo, você sente seus efeitos, mas não vê. A energia atômica, você não a vê, contudo ela faz um estrago. A energia tem várias modalidades, tem a energia hidráulica, a energia atômica, a energia térmica e, nós, temos a nossa energia particular, a energia vital que faz com que as coisas aconteçam, para que nossos órgãos funcionem. É isso que dá a dinâmica de vida para as células funcionarem. Tudo o que é parado, é inerte, é morto. Tudo que tem vida tem uma dinâmica de energia por trás.
MidiaNews – O senhor sentiu preconceito por ter feito a escolha pela acupuntura?
Alípio – Sim. Eu já faço acupuntura há 25 anos e, nesse tempo todo, houve mudança no panorama entre os colegas da classe. Hoje, eles encaminham pacientes para mim. No início, acho que só conversavam comigo porque eu era cirurgião também. Era uma coisa nova, pioneira, e acabou fazendo que existisse essa repulsa, esse preconceito em relação à medicina energética, que não tinha como explicar em uma linguagem médica.
MidiaNews – O senhor se especializou onde?
Alípio – Primeiro, eu fiz especialização na Escola Paulista de Medicina, onde fiz graduação e pós-graduação. Depois, eu fui para a China. Fiquei em Pequim por seis meses, para aperfeiçoamento. Mas eu já tinha me formado, e possuía certa experiência na área.
MidiaNews – A classe médica ainda tem resistência em relação aos benefícios da acupuntura?
Alípio - Talvez os catedráticos mais antigos, que costumam ter mais resistências às inovações. A acupuntura já foi reconhecida como especialidade médica e diminuiu muito esse preconceito, essa resistência. A minha primeira turma foi a primeira a se especializar nesta área.
MidiaNews – A acupuntura é uma técnica oriental. Como é possível aplicar algo de um padrão de vida e social diferente do nosso, já que a sociedade ocidental é estressada, tem consumismo exagerado, seja no alimento, bebidas e na compra de bens?
Alípio – Na verdade, a leis que regem a natureza humana são as mesmas no Oriente e no Ocidente, excetuando as transgressões e as peculiariedades individuais das populações. As leis da natureza e as leis energéticas, de ação e reação, que você está fadado a enfrentar e que são imperiosas dentro da abordagem terapêutica da medicina chinesa, é para todos. A gente simplesmente procura entender como as peculiariedade das populações podem ajudar, ou piorar, nessas transgressões das leis na natureza.
MidiaNews – Em quais outros casos, além da dor, a acupuntura é recomendada?
Alípio – A acupuntura é uma clínica geral. Ao invés de você usar medicamento químico, você usa medicamento físico. A agulha seria o remédio. O que muda é o estimulo. Ao invés de usar uma química, que você está ingerindo para ser metabolizada e agir nos receptores celulares, você vai fazer mediação de tratamento com as agulhas, que usa nervos como estrada para o local que você precisa acessar.
MidiaNews – Como entra a questão do equilíbrio energético da acupuntura, que parece ser mais do que um remédio alternativo ao químico?
Alípio – A acupuntura usa diversas modalidades de estímulos, eletroterapia (choques), aurículoterapia (na orelha), sistêmica (corpo todo), e procura fazer uma correção de origem, de base, de gênese daquele problema. A dor é mais fácil de tratar, menos complexa, mas os pacientes vêm procurar por diversos processos, alterações funcionais, uma TPM recorrente, hemorroidas que sangram, uma constipação intestinal, crises de diarreia... Independente do que seja, a gente sempre procura descobrir a causa do problema do paciente, e essa causa é tratada no nível das energias que estão concorrendo para esse processo desagradável.
MidiaNews – Como atua a energia no ser humano?
Alípio – A filosofia da medicina chinesa diz que cada um de nossos sistemas orgânicos tem um quantum de resistência e de vitalidade, responsáveis por funções. Os órgãos e as vísceras têm energias próprias, como se fossem centrais que governam regiões à distância. Através das energias dos órgãos principais, você vai tratar alterações, transgressões, por exemplo, de processos que, talvez, não faça muito sentido para nós. Somos focados, a gente acha que o problema está onde estamos sentindo dor. Mas a medicina chinesa não mostra isso, às vezes estamos sentindo reflexo circunstancial de uma transgressão justamente dessas centrais de energia. Você pode ter uma convulsão, um acidente vascular cerebral, um processo cerebral, então você vai procurar um neurologista, é claro, porque a pessoa teve um derrame, mas a causa pode estar no fígado.
MidiaNews – O que podemos fazer para manter o organismo em equilíbrio?
Alípio – Essa é uma resposta bastante complexa em relação a situações que você possa enumerar, mas basicamente a gente perde a saúde por transgressões. A primeira grande transgressão que concorre para as pessoas adoecerem, seja ginecológico, respiratório ou de qualquer outra doença, iniciou-se por ordem emocional. Tem pessoas que são suscetíveis a adoecer por emoções e sentimentos, uma pessoa raivosa, muito deprimida, muito preocupada. A medicina chinesa mostra que as transgressões das emoções são o grande fator de adoecimento. O segundo fator de adoecimento são as transgressões alimentares. E, hoje, isso é muito prevalecente, estamos à mercê de uma alimentação processada e industrializada. O terceiro grupo é o das fadigas físicas, mentais e sexuais. O último são as intoxicações, álcool, fumo, drogas. Essas são as grandes causas do desequilíbrio energético, os grandes vertentes que vão deflagrar todo o tipo de adoecimento.
MidiaNews – Esses são os principais males que o ser humano causa contra si? O que fazer para controlá-los?
Alípio – O grande problema nosso é a falta do autodiagnóstico. A sua impressão digital é a única no mundo. Então, seu organismo tem individualidade bioquímica e energética própria. Você precisa saber sua constituição original, o seu "manual de instrução". Tem coisas que são maléficas para mim, mas benéficas para você; e vice-versa. Depois de ter esse conhecimento, você deve buscar na natureza o que pode potencializar, o que é melhor para você, e minimizar os aspectos de adoecimento.
MidiaNews – Como saber qual o manual de instrução?
Alípio - A recomendação é fazer uma consulta com alguém que faça medicina tradicional chinesa, acupuntura constitucional, para entender qual a sua estrutura básica, avaliando e diagnosticando o seu terreno biológico mais fragilizado.
MidiaNews – Onde o ser humano pode parar com esses excessos de desequilíbrios?
Alípio – De acordo com a medicina tradicional chinesa, nós temos energia para viver 125 anos, é como se como tivéssemos uma bateria que demoraria 125 anos para descarregar. Mas, por falta de autodiagnóstico, e das transgressões, temos a amputação da nossa sobrevida original. Nós não estamos envelhecendo, estamos degenerando. Tem gente com meia idade, 40, 50 anos, com doenças de idoso. A pessoa tem artrose, desgaste de vértebra, de osso, esta infértil, impotente, esta com AVC, com Alzheimer... O que é isso? Um sinal inequívoco que não poupou sua vitalidade. Onde podemos parar? Uma amputação maior da sobrevida.
MidiaNews – O sexo em demasia também representa fadiga?
Alípio - A virtude está no meio. Nem tanto ao mar, nem tanto à terra. Em relação a fadiga sexual, é um desgaste orgânico, físico, de excesso de relações sexuais. A medicina chinesa diz que temos a energia sexual, uma modalidade dentro da energia vital. A energia sexual depende da idade. Se você está na faixa dos 20 anos, você deveria, idealmente, ter uma relação sexual a cada dois dias. Se você está na faixa dos 30 anos, o ideal é uma relação a cada três dias. Se está na faixa dos 40, a cada quatro dias e, aos 50, a cada cinco dias para dar tempo do corpo reprocessar essa energia, refazer essa energia. Se você usa essa energia de forma inadequada, pode chegar aos 40 anos impotente. A medicina chinesa tem cinco mil anos, será que isso não teria uma sustentação de verdade? Se não funcionasse, não teria durado. Você já ouviu falar naquela máxima de que tudo o que eu gosto é ilegal, é imoral ou engorda? É isso o que estamos vivendo. O ser humano é movido pelo prazer sexual, da palatinidade. As indústrias querem te pegar pelo prazer. Os alimentos de hoje utilizam componentes "alienígenas" que não fazem parte da sua composição biomolecular. É como se você estivesse dormindo com o inimigo, no café da manhã, almoço, jantar, ceia ao longo de décadas, de anos. O que você acha que vai acontecer? Você vai enferrujar suas engrenagens. Hoje, 55% dos brasileiros estão obesos, ou com sobrepeso. Isso é ao custo de alimentação mal conduzida.
MidiaNews - Apenas os médicos podem fazer a acupuntura?
Alípio – No Brasil, há estimativa de que 75% dos que fazer acupuntura são paramédicos. Na verdade, a acupuntura chegou no Brasil há mais ou menos 60 anos, pelos imigrantes. Eu sou médico acupuntor, que é muito diferente de acupunturista. Médico acupuntor tem noção da medicina tradicional chinesa, de diagnóstico e tratamento. A maioria faz "agulhoterapia", "espetoterapia". E a filosofia original não foi feita assim.
MidiaNews – Qual o risco de fazer acupuntura com alguém sem qualificação?
Alípio – Na verdade, a execução da técnica, em si, não é de risco. O grande problema é você não ter resultado. Um risco que poderia ocorrer, dentro do aprofundamento da agulha, é a perfuração de algum órgão, como o pulmão. Por isso, é preciso ter conhecimento de anatomia.
MidiaNews – Existe alguma contraindicação?
Alípio – Existem algumas. A gravidez, por exemplo, pois existem pontos abortivos. Crianças até 9 anos têm uma contraindicação relativa.
MidiaNews – A técnica da acupuntura é dolorida?
Alípio - A dor é muito relativa. Tem gente que quebra a perna e continua jogando; outros se cortam e continua cozinhando. E para alguns, qualquer coisinha mínima, já é motivo para um escarcéu. Guardada as proporções, a acupuntura é bastante tolerável. A sensação é de uma pequena picada, e as agulhas são especiais, muito finas, com espessura de 0,025mm.
MidiaNews – Quantas sessões são necessárias para conseguir o equilíbrio energético?
Alípio – Depende de uma série de fatores, como a idade. Quanto mais idoso, mais fraca a energia. Depende do estado da energia, lá dentro: ela pode estar travada, poluída, zerada, esgotada. Não existe uma estimativa. Um tratamento consiste num curso de sessões. Depois de 10 sessões, você fez um tratamento. O paciente nos procura com uma queixa principal, mas ele tem, de modo adjacente, outras questões que nem relata. Quando ele chega ao final do tratamento, diz como se sente, e fala que não tem mais insônia, as pernas não incham mais, não sente mais dor na coluna. Por meio dos relatos, percebemos que há outras melhoras subseqüentes, além do problema principal.
MidiaNews – Quanto tempo dura uma sessão?
Alípio – Também depende muito da condição da energia do paciente. Quanto menos energia ele tiver, menos tempo ele pode ficar com as agulhas. Você deixa o paciente de 30 a 40 minutos, num ambiente calmo, escuro para que ele possa relaxar e absorver esses estímulos. Mas, com a energia muito fraca, uns 15, no máximo 20 minutos. É como colocar um aparelho de 110 volts numa tomada de 220. Há uma oscilação de energia. O paciente sente um mal estar se receber essa "overdose" de energia, pode desmaiar, sentir vertigem, náusea, queda de pressão.
MidiaNews – A acupuntura é coberta pelos planos de saúde?
Alípio - Hoje, os planos de saúde cobrem as sessões de acupuntura e as oferecem na sua grade de tratamento. Mas há os que só atendem no particular; depende do profissional. Uma consulta com esse meu professor, em São Paulo, não sai por menos de mil reais.
MidiaNews – Existe tratamento estético com a acupuntura?
Alípio – Sim, existe uma subespecialidade da acupuntura que se preocupa com as afecções estéticas, estrias, varizes, rugas, celulite enfim. Eu, particularmente, não faço. Não mexo com funilaria e pintura; eu só trabalho com o motor (risos).