“Nossa, isso já aconteceu comigo!” Assim reagiu Vitória Marques de Araújo, 39 anos,moradora de Cuiabá, mãe de quatro filhos, ao saber das circunstâncias da morte do pequeno Frederico, de dois anos, filho do delegado de polícia Geraldo Gezoni, da Delegacia de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP).
O menino morreu na semana passada, em Cuiabá, depois de ser esquecido pelo pai dentro do carro, por quase cinco horas. Há menos de dois meses, em novembro de 2015, Vitória também esqueceu a filha caçula, a pequena Maria Vitória, de dois anos.
Era um sábado, tarde de clima tipicamente cuiabano, ou seja, quente, e Vitória saiu de casa para fazer as unhas e o cabelo para ir à festa de formatura do sobrinho. Envolvida por afazeres domésticos, cuidados com os filhos, preparação pessoal e o vestido que usaria naquela noite, que ainda teria de comprar ou alugar, não percebeu que havia deixado a menina trancada no carro.
Além das atribuições daquele dia, o telefonema da sobrinha querendo esclarecer dúvidas sobre algo que Vitória não se recorda mais, desviou por completo a atenção pela filha. E a garotinha, mesmo acordada, permaneceu quietinha no banco traseiro, sobre a cadeirinha, quando a mãe desceu do carro falando ao celular.
“Ela é assim, boazinha”, descreve a mãe. Vitória relata que dentro da casa da cabeleireira, quando se preparava para fazer as unhas, conversando animadamente, chegou a citar o nome da filha ao perceber que o cabelo da manicure se assemelhava com o de Maria Vitória. Nem assim, relata, lembrou-se que a menina estava sob os cuidados dela, dentro do carro.
Somente na segunda vez em que citou o nome da filha, percebeu que a criança deveria estar ali, no colo ou ao lado dela. “Minha filha, minha filha...”, repetia, enquanto olhava para os lados à procura da garotinha. Ao se dar conta de que a esquecera no carro, saiu desesperada.
No caso de Vitória, felizmente a lembrança veio a tempo de encontrá-la com vida. A mãe calcula que seu esquecimento não chegou aos 10 minutos, mas esse lapso temporal foi suficiente para deixá-la em pânico.
O desespero de Vitória só não parecia maior que o da filha. Maria Vitória, recorda a mãe, estava suada e vermelha de tanto chorar. “Eu queria levá-la ao médico para ter certeza de que estava bem, mas quando eu e ela nos acalmamos um pouco, decidi retornar para casa”, conta.
Durante semanas, Vitória ficou pensando no que poderia ter acontecido com a filha. “Não gosto nem de imaginar”, diz, complementando que, se não fosse o fato de citar o nome da filha várias vezes, poderia tê-la esquecido por horas.
JULGAMENTO – Até então, Vitória fazia eco aos que julgam e condenam pais que esquecem seus filhos em situações e ambientes que os expõem a riscos de morte, como aconteceu na família do delegado.
Quando passou pela traumática experiência, também já havia ouvido e assistido outras notícias sobre casos similares. “Eu ficava pensando, como pode um pai ou mãe se esquecer de que está levando o filho no carro?”, diz.
Hoje, além de entender que pode acontecer com qualquer pessoa, por mais amor e cuidado dispensados à criança, frequentemente é acometida pela lembrança: ”aconteceu comigo”.