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Faixa de fronteira à espera de políticas públicas é terra de ninguém
Por Eduardo Gomes/boamidia
05/04/2019 - 12:26

Foto: reprodução

Cáceres (93.882 habitantes) e seu rio Paraguai , esperando a ZPE

 

 

 

Mato Grosso tem 983 quilômetros fronteiriços com a Bolívia. Para efeito de segurança nacional, 28 municípios integram a faixa de fronteira. Nessa área residem 567.709 habitantes, que correspondem a 16,5% da população mato-grossense. A região se caracteriza por grandes vazios demográficos e imensa área alagada do Pantanal. Sua superfície é de 170.653,217 km², que representa 18,90% do território estadual. Por falta de políticas públicas e pelo vácuo do Estado, não seria exagero chamá-la de terra de ninguém. O que fazer para integrá-la e desenvolvê-la?

Faixa de fronteira é a área de 150 quilômetros de um ponto até o marco divisório, no caso de Mato Grosso, com a Bolívia, com a qual o território mato-grossense tem 983 quilômetros de fronteira sendo 730 quilômetros em solo firme e 253 em área alagada ou com separação natural por rio. A parte definida como tal é formada por Araputanga, Cáceres, Barra do Bugres, Campos de Júlio, Conquista D’Oeste, Curvelândia, Figueirópolis D’Oeste, Glória D’Oeste, Indiavaí, Jauru, Lambari D’Oeste, Mirassol D’Oeste, Nova Lacerda, Nossa Senhora do Livramento, Porto Estrela, Pontes e Lacerda, Porto Esperidião, , Reserva do Cabaçal, Rio Branco, Salto do Céu, São José dos Quatro Marcos, Sapezal, Vale de São Domingos, Vila Bela da Santíssima Trindade, Tangará da SerraComodoro, Barão de Melgaço e Poconé. Desse grupo, cinco são municípios que fazem fronteira com os bolivianos: Poconé, Cáceres, Porto Esperidião, Vila Bela da Santíssima Trindade e Comodoro  (na divisa com Rondõnia).

A Bolívia é logo ali

A Bolívia é logo ali

Essa região é banhada por rios da Bacia do Prata e da Amazônia. É caracterizada por grandes reservas indígenas. Sua malha rodoviária é ancorada pelas rodovias BR-070, 174 e 364. Cáceres é o porto mais ao Norte da Hidrovia do Mercosul, com 3.342 quilômetros até Nueva Palmira, na costa uruguaia. Cáceres é a sede da Universidade do Estado de Mato Grosso (Unemat).

Tangará da Serra, a maior cidade da área, tem 101.764 habitantes. Mato Grosso sabe que Tangará identifica-se mais com o Chapadão do Parecis, mas oficialmente o município é faixa de fronteira. Essa definição não é aleatória – basta observar o índice de criminalidade e a motivação para os crimes, para se notar que a droga está por trás de sua maioria.

A criminalidade fortalecida pelo narcotráfico é elevada na faixa de fronteira. Sua segurança ostensiva é feita pelo Exército, que tem o 2º Batalhão de Fronteira, em Cáceres, onde a Marinha opera uma unidade naval; pela Polícia Militar, que instalou o Grupo Especial de Fronteira (Gefron) em Porto Esperidião; e pela Polícia Rodoviária Federal, que reduziu seus postos na área.  A Polícia Federal é judiciária e investigativa, tem instalações na fronteira, mas por seu modus operandi tem que se manter na penumbra, salvo quando da realização de operações – o mesmo se aplica à Polícia Civil, que no momento passa pelo constrangimento do fechamento de delegacias por decisão política do governador Mauro Mendes.

 

Jauru, 9.006 habitantes

Jauru, 9.006 habitantes

A fronteira é desguarnecida, o que facilita a ação do crime transnacional, que cada vez mais se capilariza em Mato Grosso, além de usá-lo enquanto rota para os grandes centros e outros países. O Exército teve papel mais atuante na área, com destacamentos militares estruturados em Corixa, Santa Rita, Casalvasco, Palmarito etc. mas atualmente o controle policial  está mais afeto ao Gefron, que inclusive mantém policiais nos postos de fiscalização do Instituto de Defesa Agropecuária (Indea) nas rodovias próximas à fronteira

Curvelândia, 5.192 habitantes

Curvelândia, 5.192 habitantes

Há incontáveis trilhas no cerrado ligando os dois países. São as chamadas cabriteiras, por onde passam veículos roubados e furtados rumo aos bolivianos, e na direção inversa, drogas e armas. O Estado Brasileiro não tem estrutura para reverter essa realidade e se limita a montar barreiras móveis para revistas aleatórias. Na fronteira de Mato Grosso com a Bolívia o Brasil perde a guerra para o narcotráfico.

Droga não é o único gargalo na fronteira. A falta de regularização fundiária é outro grande entrave ao seu desenvolvimento e consequente ocupação. Propriedades bicentenárias não contam com documentação cartorial.  Proprietários e antigos posseiros enfrentam ameaças reais de perderem suas terras para demarcação de áreas indígenas.

Na região de Corixa, município de Cáceres, próximo a San Matias na Bolívia, o Incra criou projetos de assentamentos da reforma agrária. A região além de pobre de água, é fronteiriça e desabitada, o que expõe parceleiros ao assédio do narcotráfico, para que atuem enquanto mulas transportando cocaína da Bolívia para o Brasil. O caso é delicado e tratado com sutileza, para não trombar com o chamado politicamente correto. Porém, se cruzarem os dados de prisões e condenações de pequenos traficantes em Cáceres será possível constatar tanto o envolvimento de parceleiros quanto o de seus parentes, com esse tipo de crime.

O que a fronteira precisa?

Cáceres (93.882 habitantes) e seu rio Paraguai à espera da ZPE

A demanda é grande e parte dela atende também interesses de Mato Grosso e do Brasil.  Senão vejamos:

É preciso fortalecer a navegação comercial na Hidrovia do Mercosul e não permitir embaraços do excesso de zelo ambiental.

Construir o Porto de Morrinhos, no rio Paraguai e pavimentar 68 quilômetros da BR-174 daquela localidade a Cáceres.

Financiar via BNDES um trecho pavimentado na Bolívia – em trajeto definido por aquele país – para concluir o Corredor Bioceânico, que abrirá grande mercado vocacionado boliviano a produtos mato-grossenses, além de criar uma avenida aos portos do Sul do Chile e do Norte do Peru – que reduzem a distância aos países asiáticos.

Construir a Zona de Processamento de Exportação (ZPEde Cáceres, que se arrasta no papel há quase três décadas. A ZPE criará condições favoráveis para exportação, gerará empregos e fortalecerá a navegação na Hidrovia do Mercosul.

Restabelecer a normalidade do abastecimento do gás boliviano para a economia mato-grossense, pelo gasoduto Bolívia-Mato Grosso, e instalar um city gate em Cáceres, para abastecimento da frota rodoviária regional e em trânsito.

Pavimentar as rodovias estaduais: MT-343 entre Porto Estrela e Cáceres, para reduzir a distância das commodities do Chapadão do Parecis ao porto em Cáceres; a malha formada pela MT-265/199/473 (Estrada do Matão) em paralelo aos marcos da fronteira.

Criar um programa de regularização fundiária compartilhado pelo Incra com o Instituto de Terras de Mato Grosso (Intermat) . Retomar o programa complementar de reforma agrária Nossa Terra, Nossa Gente, idealizado e implantado pelo ex-deputado estadual Jair Mariano, quando presidente do Intermat. Nossa Terra cria um núcleo de pequenas propriedades no entorno das cidades.

Criar um programa estadual de mineração e por meio dele fortalecer a atividade na fronteira, onde há abundância de ouro em Pontes e Lacerda e Vila Bela da Santíssima Trindade; de níquel, na região de Morro Sem Boné, em Comodoro;  de chumbo, cobre e zinco em Monte Cristo, município de Rio Branco; e de ferro e fosfato na serra do Caeté, em Mirassol D’Oeste.

No papel existe o programa Pró-Mineração, criado pelo ex-governador Pedro Taques, mas que nunca saiu da gaveta.

Conquista D'Oeste à margem da BR-174

Conquista D’Oeste à margem da BR-174

Estudar e criar um programa de desoneração de serviços essenciais e de produtos, que mesmo sendo regional observe critérios sociais municipais. Zerar o ICMS da energia e da telefonia nos pequenos municípios, para estimular seu crescimento populacional – Reserva do Cabaçal tem 2.721 habitantes,  Indiavaí (2.725), Glória D’Oeste (3.045), Porto Estrela (3.050), Vale de São Domingos (3.123), Salto do Céu (3.437), Figueirópolis D”Oeste (3.537)  e Conquista D’Oeste (3.973).

Além da desoneração natural que aconteceria com a ZPE, estender idêntico benefício aos demais municípios, em algumas atividades, para gerar emprego, evitar o êxodo para os grandes centros e consequentemente fortalecer a região.

Estimular na prática o turismo de contemplação, de pesque e solte. O Pantanal, a caverna do Jabuti,  em Curvelândia; o Festival Internacional de Pesca Esportiva de Cáceres (FIPe); e as festas da idiossincrasia em Vila Bela da Santíssima Trindade, podem receber milhares de turistas anualmente, mas para tanto é imprescindível estruturar o Aeroporto Nelson Martins Dantas, em Cáceres.

Caverna do Jabuti

Caverna do Jabuti

Fortalecer a rede frigorífica regional e criar uma logística inteligente de transporte para escoamento da carne e derivados para o consumo nacional e o mercado internacional. A faixa de fronteira tem um dos maiores rebanhos bovinos mato-grossenses, com destaque para os municípios de Cáceres, Vila Bela da Santíssima Trindade, Pontes e Lacerda, Porto Esperidião e Comodoro.

Estimular a indústria láctea, que tem um de seus destaques nacionais em Araputanga (16.690 habitantes) – grande bacia leiteira mato-grossense.

Tais medidas, podem contar inclusive com investimento a fundo perdido por parte de países e organismos internacionais interessados no combate ao narcotráfico. Não é difícil mostrar a ingleses, franceses, alemães, americanos, japoneses e outros povos que boa parte da cocaína que os atinge passa pela faixa de fronteira em Mato Grosso.

PS – Este texto deveria ser lidos por deputados estaduais, congressistas e seus assessores, aos quais cabe o poder da mudança na faixa de fronteira. Também é aconselhável a Mauro Mendes, seu secretariado e asponato.

Principalmente deveria ser lido pelo deputado federal Dr. Leonardo (SD), que tem domicílio e base eleitoral em Cáceres. E pelos deputados estaduais Valmir Moretto (PRB). que mora e foi prefeito de Nova Lacerda;  Dr. Gimenez (PV). que exerce a medicina em São José dos Quatro Marcos; e por Dr. João (MDB), que é médico em Tangará da Serra.

Eduardo Gomes – boamidia

FOTOS:

1, 2, 3, 4 e 6 Boamidia

5 – Édson Rodrigues

7 – José Medeiros

 

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