Reflexões sobre o cuidado da terra como a ‘casa-comum’ de todos os seres e as dimensões social, cultural, econômica e ecológica da sustentabilidade permearam o ciclo de conferência e palestras na III Jornada de Ensino, Pesquisa e Extensão realizada entre os dias 09 e 11 de outubro no Instituto Federal de Mato Grosso, IFMT Campus Cáceres - Prof. Olegário Baldo. As intervenções contaram com a contribuição de estudiosos e profissionais de áreas diversas do conhecimento sobre sustentabilidade, incluindo saberes associados ao mundo do trabalho.
A perspectiva da Sustentabilidade Socioambiental com enfoque no “cuidado com a nossa casa-comum”, elencada na conferência de abertura da Jornada, pelo professor pesquisador do IFMT Silvano Carmo de Souza, provocou reflexões sobre a necessidade do pensamento crítico, criativo e propositivo para promoção da conservação da sociobiodiversidade que supere o olhar sobre o ambiente apenas como fonte de recursos e considere a megadiversidade biológica, ecológica e cultural existente.
“A Terra é a nossa casa-comum. A gestão, o cuidado dessa casa-comum é responsabilidade de todas e todos, e deve ser partilhada por todas e todos. Aqui a sustentabilidade está diretamente relacionada com a possibilidade de intervenção feita, sobretudo, por trabalhadoras e trabalhadores que compreendem o meio ambiente, não pura e simplesmente como fonte de recursos, mas também como fonte e espaço de lazer, ambiente de trabalho, de cultura, manifestação da sua fé e como espaço de uma espiritualidade profundamente encarnada”, aponta Silvano.
Segundo dados da organização ambientalista Conservation International, o Brasil está em primeiro lugar na lista dos 17 países megadiversos que abrigam 65% da biodiversidade do planeta. É o primeiro na diversidade de plantas e de mamíferos, o segundo do mundo na diversidade de anfíbios, o terceiro em aves e o quinto em répteis. Cenário que possibilita o oferecimento de diversos tipos de serviços ecossistêmicos que o ambiente possibilita para a vida, como alimentos, água, matéria-prima, serviços de regulação de clima, serviços culturais, de suporte e manutenção da biodiversidade.
“Ao lado dessa megadiversidade nós temos uma riqueza maravilhosa, que é a diversidade cultural. São muitas as mulheres e os homens que compõem essa diversidade cultural de povos indígenas, quilombolas, povos tradicionais, especialmente aqui os povos e comunidades tradicionais pantaneiras. E é exatamente esse encontro, essa confluência entre a megadiversidade biológica, ecológica e a diversidade cultural que gera em nós, como filhos da terra, se houver disposição ao diálogo, a possibilidade de promovermos o que chamamos de Sociedades Sustentáveis”, destacou Silvano.
Doutor em Ciências Ambientais e pesquisador na área de Ambiente e Sociedade, Silvano é presidente do Conselho Municipal de Defesa do Meio Ambiente de Cáceres, coordena o Laboratório de Educação e Gestão Ambiental do IFMT e atua como membro do Conselho Municipal de Saneamento.
Mundo do trabalho e sustentabilidade
Em meio às reflexões sobre sustentabilidade, educação e o mundo do trabalho, pesquisadores da Universidade do Estado de Mato Grosso, Unemat, Universidade Federal de Mato Grosso, UFMT e do campus do IFMT em Juína ofertaram contribuições sobre a sustentabilidade associada ao princípio da Economia Solidária, bem como, a sustentabilidade no universo de formação e atuação profissional nas áreas de Informática, Biocombustíveis, Engenharia Florestal e Agropecuária.
Com a abordagem sobre o mundo do trabalho frente ao movimento da indústria 4.0, o professor da Unemat, Robson Gomes de Melo, doutor e pós-doutor em Ciência da Computação, destacou as inovações tecnológicas no âmbito da automação do trabalho, inteligência artificial, controle e tecnologias da informação e os impactos da chamada quarta revolução industrial nos processos produtivos. Melo apontou mudanças e expectativas de exigências profissionais impostas pela nova dinâmica de produção.
No âmbito de produção dos biocombustíveis, como alternativa sustentável para matriz energética no Brasil, o pesquisador e professor da UFMT, doutor em Química, Evandro Luiz Dall’Oglio, traçou um panorama do que são os biocombustíveis com foco para os desafios tecnológicos na produção do Biodiesel e Bioetanol no país.
O pesquisador destacou a riqueza de matérias-primas no Brasil e exemplificou entre as alternativas para ampliação do Bioetanol, a produção por meio do uso da celulose contida na biomassa de origem agrícola. Com olhar para realidade regional do Oeste mato-grossense, Dall’Oglio elencou a possibilidade de inserir na produção do biodiesel, o uso da gordura residual produzida nos frigoríficos da região. Iniciativas que dependem, segundo o pesquisador, do incentivo para o desenvolvimento de tecnologias.
Com foco na agenda de formação profissional da Engenharia Florestal, o professor do IFMT Campus Juína, Rodrigo Lemos Gil, mestre em Ciências Ambientais, destacou a necessária preocupação em conservar os benefícios dos ecossistemas florestais para as gerações futuras. Na abordagem sobre o “Manejo sustentável de Florestas Nativas”, Gil que realiza doutorado em Ciências Ambientais sobre ‘aproveitamento de resíduos industriais de serraria como conservante de madeira de espécies nativas da floresta amazônica’, provocou reflexões sobre o manejo que vem sendo adotado nas florestas nativas e a busca pelo horizonte de práticas sustentáveis.
No que tange à realidade da agropecuária, o zootecnista Rafael Kill Silveira destacou desafios e possibilidades da atividade sustentável no campo. De acordo com ele, as técnicas para produção sustentável são excelentes. Os desafios estão relacionados ao modelo econômico de produção agrícola e no conceito, reproduzido na sociedade, de que o grande produtor é mais eficiente. Silveira aponta como horizonte para a sustentabilidade, a mudança econômica, política e cultural para a valorização da agricultura familiar e da pequena produção.
“Além de ela empregar 70% da mão de obra no campo, representar 40% de toda mão de obra empregada no Brasil hoje, a agricultura familiar contribui com 38% do Produto Interno Bruto e só recebe de 13% a 15% de investimento dos planos Safra. Quem é mais eficiente? O conceito geral é de que quem é mais eficiente é o grande produtor e isso tem que ser mudado”, contextualiza Silveira.
A realidade exige também, de acordo com o profissional, mudança de paradigmas no universo da formação profissional em agropecuária, refletindo nos currículos a produção em pequenas propriedades e a vocação da agricultura familiar que é responsável por 70% do alimento das famílias brasileiras.
Na conferência de encerramento, o professor da Unemat, Laudemir Luiz Zart, doutor em Política Científica e Tecnológica, abordou a Economia Solidária e a Sustentabilidade “como princípios que caminham juntos” para o bem-estar das gerações presentes e o cuidado com as gerações futuras. De acordo com Zart, a economia solidária é uma forma de organização da sociedade para a produção, consumo e distribuição dos bens produzidos de forma igualitária. Essa produção não se refere apenas a bens materiais, mas também imateriais/culturais como condição para que as pessoas se reproduzam socialmente, culturalmente, cientificamente e tecnologicamente, em processo de trabalho voltado para reprodução da vida.