Na manhã desta quarta-feira (6), foi divulgada a primeira pesquisa do Comitê para a Análise dos Feminicídios de Mato Grosso, do qual a Defensoria Pública (DPMT) faz parte, no auditório Desembargador Gervásio Leite, na sede do Tribunal de Justiça (TJMT), em Cuiabá.
A pesquisa de campo foi realizada por meio de entrevistas com parentes e amigos das vítimas, a partir de uma amostra de 15 casos, dos 46 feminicídios cometidos de janeiro a maio de 2023 em Mato Grosso.
A pesquisa revelou que 60% das vítimas já tinham contado algum episódio de violência para amigos e familiares.
“Os familiares, amigas e amigos estavam cientes da violência, porém não percebiam ou reconheciam o seu potencial de causar danos. Isso pode ter ocorrido devido a vários fatores, principalmente pela dificuldade em identificar outras formas de violência além da física e pela falta de compreensão sobre o ciclo da violência”, diz trecho do documento.
Das mulheres que tinham companheiros, quando perguntado aos familiares e amigos se a vítima, alguma vez, se queixou do relacionamento, 67% afirmaram ter ciência da reclamação.
“Os feminicídios são delitos que não bastam apenas (identificar) a autoria e materialidade, mas conhecer o entorno de como viviam aquelas mulheres, para nós trabalharmos a prevenção”, pontuou a defensora pública Rosana Leite, que compõe o comitê.
Conforme o levantamento, 69% das vítimas de feminicídio deixaram órfãos filhos menores de 18 anos.
No dia 31 de outubro do ano passado, foi sancionada a Lei 14.717, que instituiu o pagamento de pensão a filhos, menores de idade, de mulheres vítimas de feminicídio, nos casos em que a renda familiar mensal per capita seja igual ou inferior a um quarto do salário mínimo, que atualmente é de R$ 1.320. O valor da pensão será distribuído entre os filhos que tiverem direito a ela.
O levantamento apontou ainda que 80% das vítimas de feminicídio não tinham medidas protetivas contra os agressores.
“O feminicídio é um crime anunciado. Os homens são assassinados fora de casa, e as mulheres dentro de casa, ou por serem mulheres. Desde o advento da Lei Maria da Penha, os delitos que acontecem dentro de casa não são de responsabilidade da família a prevenção, mas, sim, do poder público”, afirmou a defensora.
Além da Defensoria Pública, integram o comitê o Ministério Público Estadual, Poder Judiciário, Governo do Estado, Assembleia Legislativa, Universidade Federal de Mato Grosso, Polícia Militar, Polícia Judiciária Civil, Ordem dos Advogados do Brasil, e Fórum de Mulheres Negras.
Desde março de 2015, quando entrou em vigor a Lei 13.104/2015, conhecida como Lei do Feminicídio, o crime foi positivado na legislação brasileira como uma das formas de homicídio qualificado.
A lei considera feminicídio quando o assassinato envolve violência doméstica e familiar, menosprezo ou discriminação à condição de mulher da vítima.
Segundo a pesquisa, o meio mais utilizado nos crimes de feminicídio em Mato Grosso foi arma cortante ou perfurante (60%), seguido de arma de fogo (20%), força muscular (13%), e fogo/carbonização (7%).
Em relação à faixa etária, 46% tinham entre 26 e 39 anos, 27% de 40 a 59 anos, 20% entre 18 e 25 anos, e 7% com 60 anos ou mais.
Ainda conforme o levantamento, 67% das vítimas de feminicídio eram pretas ou pardas, e 33% brancas. As servidoras Amanda Costa e Maria Angélica Rodrigues, da Assessoria Técnica de Assuntos Interdisciplinares (ATAI) da DPMT, participaram da realização da pesquisa.
O levantamento foi dedicado aos familiares, amigos e amigas das vítimas de feminicídio no estado.
“Não podemos, certamente, as trazer de volta. Mas, podemos movimentar Instituições, Poderes e Entidades Civis Organizadas para a construção de políticas públicas para prevenir a ocorrência de outros feminicídios”, diz trecho da dedicatória.