Falta de estrutura no curso de Medicina leva 20% dos alunos a desistir
Por Hipernotícias
21/02/2013 - 15:50
Os estudantes do curso de medicina da Universidade do Estado de Mato Grosso (Unemat) no campus de Cáceres não tem nada a comemorar. Mesmo tendo o privilégio de fazerem parte da primeira turma do único curso de medicina no interior do Estado, 20% dos alunos desistiram da graduação por falta de estrutura.
O curso teve concorrência recorde no último vestibular. Foram registrados 6.831 candidatos inscritos, o que representa 310,5 candidatos para cada vaga ofertada. De uma turma de 30 alunos, apenas 10 eram de Mato Grosso. A turma inicial de 30 agora está com 24 alunos (20%), pois 6 desistiram. No ano passado, o governador Silval Barbosa (PMDB) afirmou diversas vezes que curso seria importante para todo o Estado.
O pai de uma estudante, o empresário Jerônimo Samita, natural de Alto Taquari, confirma a situação.
Ele só tomou conhecimento da precariedade do curso quando foi para Cáceres. “Fui à cidade renovar o aluguel da casa que minha filha divide com uma estudante da turma e tive a oportunidade de ver o descaso. Minha filha já contava, mas não imaginei que era tanto”, afirma.
De acordo com Jerônimo, o Estado deveria se preocupar mais com o curso especialmente por se tratar de futuros médicos, além da imagem negativa que o Estado pode deixar a nível nacional.
“São alunos de diversos estados que deixam suas casas com o sonho de ser médico e não encontram estrutura, porque há uma grande diferença em ter uma estrutura no início e não ter estrutura nenhuma. Isso é o que o curso de medicina tem, nada”, afirma.
Entre os estudantes que não têm condições no curso está uma universitária de 17 anos, natural de Várzea Grande, que fala sob anonimato.
A jovem conta que problemas como a ausência de laboratórios e salas de aula, além de obras inacabadas são algumas das deficiências do curso que levaram a sua colega de quarto, natural de Uberlândia (MG), a desistir da graduação.
Assim como a colega dela, muitos estudantes de fora que vieram de Minas Gerais, São Paulo e Rio de Janeiro, por exemplo, já prestam vestibulares em outras instituições pensando em deixar a Unemat.
OBRAS
Segundo a fonte, desde seu ingresso em agosto de 2012, os estudantes aguardam a conclusão de uma obra “interminável”.
A obra se refere aos cinco laboratórios construídos na cidade universitária, sendo eles de fisiologia, anatomia, enfermagem, química e microscopia. A construção atenderia aos cursos de Medicina, Biologia, Agronomia, Enfermagem e Educação Física.
A jovem conta que na aula inaugural foi afirmado que as obras estariam conclusas em outubro, mas até hoje, o término da construção ficou apenas na previsão. “O governador estava [na aula inaugural], o prefeito também e disseram que aos poucos ia estruturando o curso, mas até agora nada. Esse curso trouxe muita gente pra cá. Mas Cáceres não deu apoio em nada, o cenário da cidade universitária não mudou”, aponta a estudante.
Com a implantação da graduação, aproximadamente R$ 180 milhões de recursos eram previstos para serem destinados à Unemat em 2011, época em que se abriu o edital do curso. No entanto, ao que tudo indica nada foi investido no local desde então.
Qualquer um que passe pela cidade universitária pode perceber que as construções foram abandonadas, com mato por todos os lados, inclusive, dentro das obras.
SEM ESTRUTURA
Como se não bastasse, para dificultar a vida dos alunos, não há como eles terem aula prática. Os laboratórios são distantes dos locais de aula teórica. Além de que materiais essenciais também estão em falta no curso.
Lâminas, cadáveres, microscópio e até livros não são oferecidos aos alunos. Além disso, conforme a estudante, a turma tem aulas em salas que não são destinadas ao curso de Medicina.
“Já teve casos em que conferências tiveram de ser interrompidas porque iam precisar da sala. Isso quando está marcado para ter aula às duas da tarde e às uma e meia recebemos o aviso que haverá mudança de sala, porque a que usamos estará ocupada”, conta a estudante anônima.
LABORATÓRIOS IMPROVISADOS
O estudante Lucas Carrijo, 19 anos, é um dos estudantes que deixou a família para investir na carreira de médico. Natural de Minas Gerais, ele assegura que há problemas no curso e que por enquanto a ausência dos laboratórios está sendo solucionada pelos professores.
“Não tínhamos laboratórios todos os dias, mas o professor entrou na internet e conseguiu ensinar sem laboratório. É assim que está acontecendo, os professores estão dando jeito”, afirma.
De acordo com Lucas e seguindo o plano de ensino, a construção do laboratório pode ser esperada por, pelo menos, um ano. “Essa é uma discussão que sempre temos no curso. É preciso paciência para resolver os problemas, mas precisa de garantias que será resolvido”, aponta.
Segundo o jovem, o que mais preocupa no momento não são somente os laboratórios, mas a possibilidade de falta de professores, principalmente porque em março é o período de entrada da segunda turma e mais 30 alunos.
“Por agora, não podemos reclamar dos professores, mas vão faltar professores com a entrada da outra turma. O quadro de funcionários é insuficiente. Não tem especialistas”, aponta.
QUALIDADES DO CURSO
No entanto, os jovens estudantes lembram que é preciso reconhecer que o curso não é de todo ruim. Em dezembro foram adquiridos materiais de tecnologia de ponta, além do sistema PBL (Problem-Based Learning) de ensino que é responsável pelo ensino das bases teóricas da medicina.
O método não inclui aulas teóricas organizadas numa estrutura de disciplinas suportadas por um sistema de departamentos. O ensino é feito exclusivamente com apoio de seminários enquanto o ensino clínico começa logo no primeiro ano.
“Esse ensino é bom. Se conseguimos concluir o primeiro semestre é graças ao método e aos professores, porque estrutura falta”, afirma a universitária enquanto Lucas completa dizendo “Não é porque não temos laboratórios que não estamos aprendendo. Temos o essencial e só. Se nada mudar, daqui um tempo tudo piora”, finaliza.
UNEMAT
O porta-voz da Unemat não confirmou o número de evasão dos alunos, pois as rematrículas ocorrem somente no início de março.
Sobre os dois blocos dos laboratórios que estão parados, a assessoria informa que o motivo é que a empresa responsável, Grassi Construções, abandonou a obra alegando incapacidade financeira.
A desistência ocorreu em 2011 e desde então, a universidade aguarda a Secretaria de Cidades (Secid) atualizar as planilhas de valores para realizar nova licitação. Por enquanto a obra segue parada.
Quanto à ausência de professores, o porta-voz informou que embora o quadro efetivo dos servidores seja reduzido são realizados contratos temporários, inclusive, muitos deles já estão em vigência e nem um aluno fica sem aula, segundo informações.