Jornalistas criam cerveja com cara e sabor cuiabanos
Por Midia News
14/04/2013 - 11:31
A fabricação de uma cerveja caseira pode ir além de usar ingredientes essenciais, como malte e lúpulo. É, também, a oportunidade de criar uma identidade única para a bebida, com o uso de receitas tradicionais de uma região - mesmo que, à primeira vista, a mistura pareça improvável.
Em Cuiabá, os jornalistas Anselmo Carvalho Pinto e Rodrigo Vargas, que fazem cerveja por hobby, resolveram ir por esse caminho. Assim, criaram a "Benedita", com a proposta de ser tipicamente regional.
A do tipo Pale Ale (mais clara) é feita com pixé (milho torrado, açúcar e canela). A Stout (escura) leva furrundu (mamão e rapadura) em sua receita. Dois doces típicos da terra cuiabana.
“A ideia era fazer uma cerveja que explorasse a questão regional. No Rio Grande do Sul, por exemplo, a gente sabe que tem gente que faz cerveja com chimarrão. Queríamos ir por esse caminho também”, conta Rodrigo.
Em relação ao nome, a ideia era algo que fosse a cara de Cuiabá. O santo, São Benedito é o mais popular e o nome, em si, também é bastante comum na cidade. Não por acaso, a imagem da tradicional igreja de São Benedito, localizada no centro de Cuiabá, está no rótulo.
Rodrigo e Anselmo, conhecidos de longa data e apreciadores de cerveja há bastante tempo, começaram a fazer a bebida no ano passado, quando voltaram a trabalhar na mesma redação, no Diário de Cuiabá.
“Eu sabia que era possível fazer cerveja em casa e o Rodrigo também estava interessado. Aí, um dia, eu disse pra gente comprar nossa fábrica e ele topou”, conta Anselmo.
Minifábrica
O investimento no “kit-básico” para fabricação de 20 litros de cerveja custou em torno de R$ 1,5 mil. O material foi comprado de um vendedor de Belo Horizonte (MG), que também deu muitas dicas de fabricação para os dois amigos.
Arquivo pessoal
Rodrigo Vargas: apesar do preço, cerveja artesanal tem mais retorno que a comum
Os dois compraram também uma geladeira, usada para fazer a fermentação. Dependendo da cerveja, isso tem que ser feito em temperaturas mais baixas. A minifábrica fica na casa do Rodrigo.
Em agosto de 201, a primeira cerveja feita por eles, uma american pale ale, foi com os itens básicos. A ideia de colocar pixé veio na segunda receita. O furrundu, na terceira.
Após mais uma leva de pilsen, veio outra cerveja de pixé, dessa vez com porções mais generosas do doce. E, para esse final de semana, a ideia era fazer outra de furrundu, com doses maiores do ingrediente. As cervejas demoram, no mínimo, 30 dias para ficarem prontas para o consumo.
O presidente da Associação dos Cervejeiros Artesanais de Mato Grosso (Acerva-MT), Juan Pagnussati, elogia a adição de ingredientes típicos daqui nas receitas.
“Acho maravilhoso que isso esteja acontecendo, porque é uma coisa bem regional. Adicionar receitas locais agrega valor e dá uma identidade à cerveja. Sei de pessoas que fizeram com castanha-do-pará, rapadura e maracujá. No Brasil, isso ainda não é muito comum, mas na Europa é”, afirmou.
Na opinião dele, a iniciativa pode ajudar a levar ao conhecimento das pessoas que não existe somente um tipo de cerveja, e que é possível sair da mesmice e experimentar novos sabores, com diferentes harmonizações.
“Há uma infinidade de opções, de gostos. Podemos usar chocolate, café, frutas. É possível usar muita coisa para fazer cerveja e muita gente não sabe disso”, afirma.
Aprendizado e primeira vez
Os jornalistas aprenderam todo o processo de fabricação pela internet. Os dois começaram a pesquisar diversos sites sobre o tema e a pedir informações com quem tinha experiência no assunto.
“Todas as dúvidas que você tiver, alguém já teve. E já foi respondida na internet. Nessa historia da popularização da cerveja caseira, a internet foi fundamental”, conta Anselmo..
“Na internet tem muita coisa e muita gente disposta a compartilhar o conhecimento. Isso foi fundamental”, concorda Rodrigo.
Eles contam que ficaram bastante felizes quando fizeram cerveja pela primeira vez.
“Fazer cerveja é maravilhoso, é como ter um filho. Você vê a coisa nascer, crescer. Eu fiquei emocionado quando fiz pela primeira vez. Para quem gosta, é fantástico”, conta Anselmo.
O desafio, diz Rodrigo, era fazer a cerveja e ela ficar boa.
“Eu fiquei ansioso. Ficava abrindo a geladeira e cuidando para ver se estava tudo indo bem. Depois de pronta, a sensação foi muito bacana – o gosto estava bom, deu tudo certo”.
Apesar do gosto pela coisa, os dois não têm data fixa para fazer cerveja, até porque nem sempre as agendas coincidem. “Infelizmente, fazemos com uma frequência menor do que gostaríamos de fazer”, afirma Anselmo.
E já há um novo ingrediente sendo avaliado pela dupla: a polpa de bocaiúva. Mas, por enquanto, é somente uma ideia.
Paixão pelas especiais
Anselmo conta que sempre gostou de cervejas especiais, mesmo quando não tinha acesso aqui em Mato Grosso.
“Nas viagens que eu fazia, eu sempre tomava cerveja diferente porque eu gostava. E eu já imaginava que um dia ia ter que chegar aqui, e finalmente chegou. E sempre tive o desejo de fazer cerveja”, diz.
Já a paixão de Rodrigo é mais recente. Começou a gostar de cervejas especiais em 2007, quando, por motivos profissionais, mudou-se para Campo Grande (MS).
Lá, ia a mercados onde havia variedade de rótulos e teve a curiosidade de experimentar. Aos poucos, foi pegando o gosto e percebendo a ampla variedade e a complexidade desse tipo de bebida.
Arquivo pessoal
Juan Pagnussati: ingrediente regional ajuda a criar a identidade da cerveja
“E, apesar do preço, a cerveja especial tem mais retorno do que a comum. Em sabor, em qualidade, em tudo”, assinala Rodrigo.
Anselmo ressalta a qualidade das artesanais sobre as cervejas comerciais.
“Qualquer cerveja feita em casa é melhor do que essas comuns que a gente compra. A primeira pilsen que fizemos em casa – e nunca tínhamos feito na vida - ficou melhor do que as pilsen vendidas em mercado”, afirma.
A justificativa, ele explica, está no uso dos ingredientes. “Porque você faz só com malte. Já as comerciais usam malte, arroz. O fato de ser puro malte já ‘derruba’ essas cervejas comerciais todas. Não estou dizendo que a minha é a melhor cerveja, mas digo que uma caseira é melhor”, afirma.
O jornalista, no entanto, diz que essa constatação está longe de ser uma restrição em relação às comerciais.
“Eu bebo cerveja comum quando estou em um churrasco ou algo do tipo. Não tenho preconceito, sem problema algum”.
Cerveja sem frescura
Nem Anselmo e nem Rodrigo têm a pretensão de ganhar prêmios com a Benedita. A ideia é fazer uma cerveja cada vez melhor, para consumo próprio e presentear os amigos.
“Não tenho a ideia de competir. Quero fazer cerveja gostosa, nada de ganhar prêmio. Uma coisa que sempre digo: a gente tem que tomar cuidado para que a cerveja não se torne o vinho, ou seja, uma chatice, com uma falação sem fim. Acho isso uma frescura. Beba e curta. Minha política é essa”, afirma.
Em outras palavras: sem frescura. Combina com cerveja.