O Ministério Público do Trabalho em Mato Grosso (MPT-MT) reuniu-se na tarde desta terça-feira (19) com o prefeito, os vereadores e outras autoridades do município de São José dos Quatro Marcos, para discutir as consequências da decisão da JBS de dispensar, de uma única vez, os 650 trabalhadores da unidade. O MPT alega que a multinacional brasileira, detentora das marcas Friboi e Seara, agiu com descaso ao desligar de maneira abrupta seus empregados, sem levar em conta os impactos econômicos e sociais que a medida poderia causar na região.
O município tem hoje, aproximadamente, 19.500 habitantes. Em outras palavras, a demissão provocará o desemprego de mais de 3,33% da população. Para o procurador do Trabalho Leomar Daroncho, a forma como a empresa conduziu o processo evidencia sua única preocupação: a defesa de seus interesses comerciais.
Segundo Daroncho, se considerada apenas a população economicamente ativa, o frigorífico estará decretando o desemprego de mais de 15% dos habitantes, situação inadmissível para uma corporação que recebe benefícios fiscais, como isenção do pagamento do Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU), e generosos financiamentos públicos.
Aponta o MPT que, além de violar o princípio da função social da propriedade e do valor social do trabalho, tão importantes quanto o próprio direito à propriedade e à livre iniciativa, a dispensa das centenas de funcionários seria abusiva em razão de não ter sido precedida de efetiva e válida negociação coletiva com o sindicato laboral, conforme entendimento vigente no Tribunal Superior do Trabalho (TST).
O critério é adotado desde 2009, quando a instância máxima da Justiça do Trabalho fixou o entendimento de que a negociação coletiva é imprescindível nesses casos. "Trata-se de medida preventiva em virtude do forte impacto social causado por súbitas demissões em massa. Por isso, é necessário adotar certas cautelas, de modo a conciliar os direitos do empregador com o seu dever de promover a função social da propriedade e o bem-estar social", complementa Leomar Daroncho.
O procurador revela que foram ignoradas as situações particulares de trabalhadores que usufruem de estabilidade, tais como gestantes, acidentados e idosos, muitos deles às vésperas da aposentadoria.
Ele complementa dizendo que os argumentos utilizados no comunicado entregue aos trabalhadores para noticiar o fato e justificar a decisão são frágeis e questionáveis. "Essa é justamente a região que concentra o maior rebanho bovino de Mato Grosso, e as questões mercadológicas e estratégicas da empresa, na visão do MPT, não podem ser usadas como pretexto para violar direitos sociais dos trabalhadores: o dano social decorrente da conduta abusiva é evidente", afirma.
Empresa criou falsa expectativa
A presidente do Sindicato dos Trabalhadores na Indústria da Alimentação (SINTIAAL), Gláucia Maria Andrade Gonzaga, relata que a comunicação do fechamento da unidade foi feita no início de maio, em reunião convocada pela empresa, que, na época, chegou a cogitar a transferência de alguns empregados para a planta de Araputanga.
Considerou, ainda, em Termo Aditivo ao Acordo Coletivo de Trabalho de 2015, a possibilidade de suspender temporariamente, pelo período de dois a cinco meses, os contratos de trabalho, ao invés de simplesmente rompê-los, e inserir posteriormente os colaboradores a programas de qualificação.
As expectativas, no entanto, não se confirmaram e, entre os dias 13 e 19 de maio, os Termos de Rescisão de Contrato de Trabalho começaram a ser homologados. A presidente do sindicato esclarece, além disso, que os empregados gozaram de férias coletivas no mês de abril e, quando retornaram ao trabalho, receberam a notícia de que cumpririam o aviso prévio indenizado.
"Gerou-se uma falsa ideia de segurança momentânea, contudo, não houve manifestação do frigorífico acerca da possibilidade ou intenção em fornecer o treinamento", assevera a representante da categoria.
O MPT também aponta a incongruência da conduta do grupo ao pregar valores que, na prática, não segue. "A empresa investe pesadamente em propaganda, com o objetivo de construir uma imagem positiva perante o público consumidor, sem, no entanto, atuar para que 'o bem comum' e o 'futuro melhor a todos os colaboradores' sejam alcançados. Essa situação é uma prova disso", concluiu o procurador do MPT.