MPT consegue condenação da JBS em R$ 1 milhão por irregularidades trabalhistas
Por assessoria
14/12/2014 - 21:53
A unidade da JBS em Juara, localizada a 640 km de Cuiabá, foi condenada na terça-feira passada (2) ao pagamento de R$ 1 milhão por danos morais coletivos. O valor da indenização, inicialmente de R$ 200 mil reais, foi majorado pela 1ª Turma de Julgamento do Tribunal Regional do Trabalho da 23ª Região (TRT-MT), que, por unanimidade, deu parcial provimento ao recurso interposto pelo Ministério Público do Trabalho em Mato Grosso (MPT-MT).
Entre outras irregularidades, a empresa não computava como jornada de trabalho o tempo utilizado pelos empregados para deslocarem-se de suas casas até o frigorífico e vice-versa. Como o transporte era fornecido pela própria JBS, em razão da cidade não possuir transporte público regular, o tempo despendido pelo trabalhador durante esse trajeto deveria ser considerado como horas in itinere e, portanto, remunerado.
Ainda, para afastar a obrigação, a JBS alegou que o município havia implementado o transporte público intermunicipal. Todavia, uma inspeção realizada pelo MPT comprovou que a condução utilizada pelos trabalhadores não tinha natureza pública e sim privada, sendo destinada única e exclusivamente aos seus empregados.
“Chama a atenção, ainda, o fato de as linhas disponibilizadas sempre iniciarem ou terminarem no ‘Km 08 da rodovia MT 338’, coincidentemente o local onde está situado o réu. (...) Ademais, não havia outras paradas a não ser a sede da ré. Ora, para que um transporte possua natureza pública, ele precisa atender a toda população, e não apenas aos empregados de um determinado estabelecimento. Ressalta-se, ainda, que o pagamento à empresa que realiza o alegado ‘transporte público’ é feito pela própria demandada.”, argumentou o relator do acórdão, o desembargador Roberto Benatar.
Ressaltou ainda o relator que, diferentemente do alegado pelo frigorífico, “a concessão do transporte aos empregados passa longe de ser uma benesse, constituindo-se, deveras, uma forma de atrair empregados para aquela atividade, a qual não seria viável se não houvesse tal concessão”.
Aos trabalhadores residentes em Juara foram concedidos 20 minutos diários, computados aí o tempo de ida e de volta do trabalho, como de efetivo serviço. Para os residentes em Porto dos Gaúchos, o tempo acrescido foi de 50 minutos diários. Por fim, aos residentes em Novo Horizonte do Norte, somam-se à jornada de trabalho 40 minutos diários. Também haverá o acréscimo de mais 40 minutos na jornada laboral, correspondentes ao tempo médio despendido pelos empregados entre a espera da condução fornecida pelo frigorífico e a partida do ônibus em direção às residências.
Segundo o MPT, a medida é necessária porque os trabalhadores que dependem do transporte fornecido pela empresa aguardavam muito tempo para o embarque nos ônibus, que só partiam quando atingissem lotação máxima. Atualmente, os veículos saem da unidade em horários previamente definidos, independentemente do número de passageiros. Entretanto, ainda assim, não há um ajuste entre o horário de saída do posto de trabalho das equipes com o horário de partida dos ônibus.
A procuradora do Trabalho Amanda Broecker, que sustentou na sessão de julgamento, explica que, quando esses minutos não eram considerados como de efetivo serviço, o trabalhador ficava mais tempo à disposição do empregador, sem compensação ou recebimento de horas extras.
“A importância do acórdão que majorou o dano moral coletivo revela-se na imposição de adequada resposta ao desrespeito à segurança e à saúde do trabalhador. A conduta da empresa, ao não computar as horas de percurso, camufla a duração real da jornada, excedendo os limites fixados em lei e aumentando os riscos de acidentes do trabalho. A matéria é pacífica no TST [Tribunal Superior do Trabalho], conforme a Súmula n. 90, sendo que a ré, desprezando o ordenamento jurídico, resolveu não cumpri-lo”.
Em relação à outra irregularidade apontada pelo MPT, sobre o condicionamento da entrega de cestas básicas à assiduidade de 100% do empregado, a procuradora afirmou que, “além de violar norma coletiva, obrigava o trabalhador a ir laborar doente, pois sequer as faltas justificadas eram aceitas, o que é muito grave”.
Exército de vítimas
O MPT foi bem-sucedido no pedido de majoração do valor da indenização por dano moral coletivo ao ponderar sobre a importância da teoria do desestímulo, que, basicamente, defende forte repressão aos atentados aos direitos humanos e às garantias constitucionais para que o ofensor se sinta efetivamente punido e não volte a reincidir na irregularidade.
As inúmeras, porém brandas condenações em reclamações individuais não têm se mostrado suficientes para obrigar a JBS a cumprir a lei. “É preciso, com maior veemência, que se reconheça que o valor das condenações que vêm sendo deferidas não tem impedido a reiteração das lesões perpetradas pela Ré contra a ordem jurídica. Análise empírica revela que a reclamada responde por cerca de 30% da pauta das sessões das duas Turmas do TRT-MT. O número real talvez seja até maior do que isso! E a situação se repete nas Varas do Trabalho”, conforme parecer exarado pelo procurador Leomar Daroncho.
Dados revelam que a JBS segue produzindo um exército de vítimas. Conforme dados do Anuário de Acidentes do Trabalho do INSS de 2011, o setor de frigoríficos é o quinto em número de acidentes no Brasil. Já em Mato Grosso, fica em primeiro colocado no ranking. “O setor de frigoríficos vem transferindo à sociedade o drama humano e os custos (Previdência) de sua atuação à margem da Lei, sem que as condenações se mostrem efetivas”.
Bilhões
Após a aquisição da Seara, foi divulgado no site do Grupo JBS que a quantidade de funcionários chegaria a 185 mil e, sua receita, a R$ 100 bilhões. Com esses números, tornou-se a maior empresa privada do Brasil e o maior frigorífico do mundo.
Com as informações, o MPT também demonstrou que o valor anteriormente estabelecido a título de dano moral coletivo não levava em consideração o porte econômico da JBS, não servindo, portanto, de desestímulo para futuras violações de direitos. “O arbitramento de valor insignificante acarreta vantagem ao infrator, que, sopesando o lucro obtido em decorrência da violação ao ordenamento com a sanção que lhe foi imposta, concluiu ser mais benéfico seguir praticando o ilícito”, fundamentou o desembargador Benatar.
De acordo com a ação civil pública ajuizada em 2012, pelo procurador do Trabalho Bruno Choary Cunha de Lima, a empresa também foi acusada de praticar concorrência desleal, uma vez que a sonegação de tributos e encargos trabalhistas diminui os custos de produção, prejudicando as outras que cumprem rigorosamente a legislação trabalhista.
“Mesmo numa sociedade capitalista, onde a maximização do lucro é a condição sine qua non [indispensável] de sua existência, o trabalho humano é o bem primordial a ser valorizado, pois constitui a base do sistema econômico, emergindo como principal fator de produção gerador de riqueza, a par de se afigurar como o instrumento pelo qual o homem se dignifica e realiza sua condição humana, desenvolvendo as potencialidades inerentes à sua personalidade, daí sua relevância social e a necessidade de efetiva proteção pelos meios legais idôneos”, reforçou o relator.
Processo nº 0000085-45.2012.5.23.0116