Dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) apontam que nesses primeiros 32 dias do período proibitivo para as queimadas em Mato Grosso, iniciado no dia 15 de julho, foram registrados 6.125 focos de calor, número 101% maior que o mesmo período do ano passado, que alcançou 3.430 focos. O Batalhão de Emergências Ambientais (BEA) atendeu, até o momento, 375 ocorrências. Uma pessoa foi presa em flagrante no município de Cláudia.
Gaúcha do Norte (595 km ao norte de Cuiabá) está no topo do ranking, com 452 registros (ou 7,3% do total), seguido por outras 19 cidades, que representam 53% ou 3.288 focos de calor. Entre elas estão: Nova Nazaré (370), Colniza (285), Campinápolis (284), Ribeirão Cascalheira (284), São Felix do Araguaia (244), Barra do Garças (228), Alto Boa Vista (222), Paranatinga (149), Comodoro (142), Canarana (136), Tangará da Serra (132), General Carneiro (126), Rondolândia (116), Nova Bandeirantes (106), Santa Terezinha (103), Santo Antônio do Leste (99), Araguaiana (91), Cotriguaçu (86) e Luciara (85).
Conforme balaço do BEA, as propriedades privadas são responsáveis por cerca de 60% dos focos de calor. As terras indígenas aparecem no gráfico com 26% do total, acompanhadas pelas unidades de conservação estadual, com 1,57% e assentamentos, 5, 24%.
Esse quadro de aumento já repercutiu negativamente na qualidade do ar. De acordo com o monitoramento do Laboratório de Ensaios da Secretaria de Estado de Meio Ambiente (Sema-MT), entre 15 de julho e 15 de agosto, 11 municípios apresentaram ‘qualidade do ar inadequada’, enquanto no mesmo período de 2015 apenas quatro cidades do estado estavam nessa categoria.
O limite permitido de material particulado oriundo da fumaça de queimadas é considerado tolerável para seres humanos até 25 microgramas (µg) por metro cúbico de ar (m³), valor que está oscilando entre 20 e 40 µg/ m³ desde o início da proibição às queimadas. É o caso de Sorriso, Colíder e Vila Rica, por exemplo, localidades onde o volume de poluentes chegou a atingir 43 µg/m³, 33 µg/m³ e 34 µg/m³, respectivamente, o que pode levar ao agravamento de várias doenças, principalmente as respiratórias.
Número de focos de calor diminui
Apesar destes dados, o comandante do BEA, tenente coronel do Bombeiro Militar (BM) Paulo André Barroso, lembra que os números de focos de calor caíram em relação à semana passada. Entre os dias 7 e 13 de agosto, o satélite Aqua do Inpe identificou 4.841 focos, número 203% maior que o mesmo período do ano passado. “Diminuímos um pouco mais que 100% nesta semana, mas ainda estamos no início do período proibitivo e o cenário brasileiro é propício para uma elevação dos números nos próximos dias”.
Falta de chuva e ação humana
Para Barroso, um dos fatores que contribui para a tendência de piora do período proibitivo no estado é o El Niño, fenômeno climático que envolve o aquecimento incomum das águas superficiais e subsuperficiais do Oceano Pacífico Equatorial. Ele explica que esse evento periódico alcançou o pico em dezembro do ano passado e os reflexos tendem a elevar as temperaturas globais e alterar padrões climáticos por pelo menos 12 meses, causando impacto social e ambiental no mundo todo.
Uma das consequências desse fenômeno é a falta da chuva na Amazônia Legal, o que colabora para a elevação da temperatura no Centro-Oeste brasileiro. “A floresta Amazônica absorve a água do solo, manda para atmosfera e então ela chega aqui, mas devido a seca a previsão é de escassez das chuvas, o que pode elevar os índices dos incêndios florestais”.
O comandante do BEA avalia que a chuva que caiu em Cuiabá e municípios adjacentes esta semana não teve impacto significativo no clima da região. “Essas chuvas esporádicas amenizam o clima no momento e, no máximo, 24 horas ou 48 horas depois. Após isso voltamos ao estado crítico”.
Além do El Niño, a ação humana é um dos fatores que ocasionou o agravamento do quadro ambiental do estado. Nessa época do ano são raras as vezes que um foco de incêndio começa por causas naturais. A maioria deles inicia devido à atitude antrópica do homem, como uma simples fogueira nas folhas para limpar o quintal ou atirar uma bituca de cigarro na estrada pela janela do carro. “É preciso ter a consciência de que uma pequena fogueira pode causar um incêndio devastador. Peço para as pessoas não fazerem o uso do fogo em hipótese nenhuma porque as consequências são irreversíveis à saúde humana e ao meio ambiente”, ressalta Barroso.
Plano de combate
O total de investimentos entre Corpo de Bombeiros e Sema pode chegar a R$ 4 milhões, por meio de uma estrutura de atendimento descentralizada que atenderá os 141 municípios. Também foram estabelecidas parcerias com diversos órgãos e instituições, como o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), Ministério Público Estadual e Federal, e setor produtivo, por exemplo.
A estrutura de atendimento conta com o apoio das 18 unidades do Corpo de Bombeiros nos municípios mais populosos, oito brigadas municipais mistas em regiões mais sensíveis ao fogo (Feliz Natal, Sinop, Cláudia, Ipiranga do Norte, Vera, Sapezal, Campo Novo dos Parecis, Aripuanã, Comodoro, Porto Esperidião) e 10 bases descentralizadas que irão atender as situações mais críticas. Entre brigadas mistas e bases volantes, está prevista atuação de 260 oficiais de bombeiros e 48 agentes civis, montante 310% maior que o do ano passado.
Para atingir mais precisão e uma maior área com resposta rápida, o planejamento deste ano prevê suporte às equipes com dois aviões de combate a incêndio florestal, com capacidade de 3,1 mil litros de água, um helicóptero da Coordenadoria Integrada de Operações Aéreas (Ciopaer), 18 veículos Auto Rápido Florestal (ARF), 18 caminhonetes Auto Bomba Tanque Florestal (ABTF), com capacidade para 2,5 mil litros de água, e cinco Auto Florestal (AF). Além disso, a equipe conta com equipamentos de manuseio em mata, como facões, foices, sapas e abafadores.
Denúncias
Utilizar fogo para limpeza e manejo nas áreas rurais é crime passível de seis meses a quatro anos de prisão, com autuações que podem variar entre R$ 1 mil (pastagem e agricultura) a R$ 75 mil por hectares (em Área de Preservação Permanente – APP). Além de denunciar queimadas rurais pelo 0800 647 7363, a população também pode registrar as ocorrências no Corpo de Bombeiros.
Nas áreas urbanas, o uso do fogo para limpeza do quintal é crime o ano inteiro, conforme a legislação de cada município. As denúncias devem ser feitas por telefone, no 193 do Corpo de Bombeiros, ou nas secretarias municipais de meio ambiente. O período proibitivo para queimadas na área rural segue até 15 de setembro, podendo ser prorrogado devido às condições climáticas.