O Poder Judiciário de Mato Grosso, por meio da 1ª Vara Criminal da Comarca de Cáceres, lança nesta terça-feira (11), às 14h, no Plenário do Tribunal do Júri do Fórum local, o Projeto Clube do Livro de Remição de Pena pela Leitura. Trata-se de uma iniciativa que promove a ressocialização de pessoas privadas de liberdade por meio do incentivo à leitura, reflexão e desenvolvimento de senso crítico.
A ação foi idealizada e implementada pelo juiz José Eduardo Mariano, em conformidade com a Resolução nº 391/2021 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que reconhece a leitura como prática social educativa. O projeto conta com parceria da Universidade do Estado de Mato Grosso (Unemat), por meio de professores e acadêmicos do curso de Direito do Campus Jane Vanini.
Nesta primeira etapa, o projeto atenderá 20 reeducandos, com previsão de expansão para até 80 participantes por unidade em 2026, conforme disponibilidade estrutural e logística. Para isso, foram criados dois clubes de leitura: o “Nelson Mandela”, na Unidade Prisional Masculina, e o “Eunice Paiva”, na Unidade Prisional Feminina.
O acervo a ser utilizado é composto por obras consagradas da literatura brasileira nos gêneros conto e crônica, além de novelas gráficas premiadas, incluindo adaptações de romances vencedores do Prêmio Jabuti.
Embora ainda não haja dados consolidados sobre a remição de pena pela leitura no município, o juiz José Eduardo Mariano avalia que a criação das bibliotecas, o treinamento dos mediadores e a implantação da metodologia já representam avanços concretos para o sistema prisional de Cáceres. “Sabemos que pessoas que cultivam o hábito da leitura tendem a reincidir menos. A literatura permite imaginar outros mundos e repensar a própria trajetória. No processo de reeducação, essa capacidade de reflexão é essencial para a construção de um novo horizonte de vida”, afirma o magistrado.
O juiz destaca ainda que o projeto representa um avanço em relação às práticas já adotadas nas unidades prisionais, ao priorizar o diálogo e a troca de experiências. “Tradicionalmente, a remição de pena pela leitura se baseia na produção de resenhas escritas. No Clube do Livro, buscamos ir além. Buscamos promover o debate, o compartilhamento de ideias e a expressão oral. Essa interação é fundamental no processo de transformação pessoal”, explica.
Segundo ele, a parceria com a Unemat garante a continuidade e a qualidade das ações. “Com a participação de professores e acadêmicos, o projeto ganha uma base sólida e permanente. As obras foram cuidadosamente selecionadas pelo coordenador, professor Juliano Kersul, com foco em textos que despertem reflexão e senso crítico. Também recebemos o apoio da Livraria Janina, que mobilizou doações e contribuiu para a formação do acervo, incluindo obras de autores mato-grossenses. Isso fortalece não apenas a ressocialização, mas também a valorização da cultura do nosso estado. Queremos que este seja apenas o começo e que o projeto se amplie a cada ano, levando mais conhecimento, debate e esperança a quem está em processo de recomeço.”
Metodologia
O Clube do Livro de Remição de Pena pela Leitura é resultado de um projeto de extensão da Unemat, inspirado na experiência do Clube do Livro Capitu, criado em 2022 e coordenado pelo professor Juliano Moreno Kersul de Carvalho. Em 2024, o grupo foi institucionalizado pela Portaria nº 01/2024 da 1ª Vara Criminal, e, em 2025 recebeu aprovação como projeto de extensão da universidade.
A metodologia, desenvolvida especialmente para o ambiente prisional, prevê 18 encontros presenciais por semestre em cada unidade prisional, com duração de duas horas cada. Na primeira hora, os mediadores de leitura realizam leituras em voz alta de contos ou crônicas da literatura brasileira, seguidas de uma roda de conversa para troca de impressões sobre o texto. Em seguida, os reeducandos têm acesso a outras obras literárias para leitura individual, conforme seu interesse.
A cada 12 encontros de que tenha participado, o reeducando terá direito à remição de quatro dias de pena, podendo alcançar até 48 dias por ano. A seleção dos participantes é feita pela direção de cada unidade prisional, com prioridade para internos que possuam Ensino Médio completo ou superior. Todos os participantes receberão certificação emitida pela Unemat.
A Universidade também atuará diretamente na formação dos mediadores e na execução do projeto, unindo ensino, pesquisa e extensão. “Estamos adaptando a ferramenta ‘clube do livro’ para o ambiente prisional, com uma metodologia específica que poderá ser replicada em outras comarcas do estado”, explica o professor Juliano Kersul, coordenador do projeto.