Em 05 de outubro de 1988 a Constituição da República Federativa do Brasil foi apelidada de "Constituição Cidadã" por Ulysses Guimarães, tendo em vista trazer no seu bojo várias normas voltadas para o atendimento social da população brasileira. Passados mais de 25 anos da sua promulgação, a “Constituição Cidadã”, trouxe como um de seus direitos e garantias individuais a assistência jurídica integral e gratuita, conforme vai veiculado no seu art. 5º., inciso LXXIV, lembrando-se que esse trata de gênero que compreende a assistência jurídica gratuita stricto sensu, a assistência administrativa gratuita, a assistência judiciária gratuita e a gratuidade de justiça.
Essa assistência jurídica gratuita stricto sensu, assim consideradas as atividades técnico-jurídicas voltadas à informação, consultoria, aconselhamento e orientação dos cidadãos, é o primeiro caminho para se poder garantir o efetivo acesso à Justiça, pois em algumas situações somente com a atividade dos profissionais da advocacia pública, caso da Defensoria Pública, e dos órgãos judicantes, caso do Poder Judiciário, e dos fiscais da lei, caso do Ministério Público, é que direitos sociais básicos ganham total efetividade.
No Estado de Mato Grosso, a população ribeirinha da bacia do Rio Cuiabá ficava excluída do exercício da sua cidadania, pois os poderes constituídos ficam distantes e as condições sócio-econômicas não permitiam os deslocamentos aos municípios sedes das comarcas para a solução dos seus problemas jurídicos. Essa exclusão começou a ser afastada quando a Defensoria Pública, o Poder Judiciário começaram uma parceira institucional de grande alcance social com o lançamento do Projeto Ribeirinho Cidadão.
Por esse projeto, a população ribeirinha necessitada, aquela que não conseguia vir às sedes das comarcas, onde se situam os fóruns de Justiça, passou a ser atendida de forma integral, com os conflitos sendo solucionados de forma imediata ao serem apresentadas a petição inicial, a colheita da prova, o parecer e a sentença, numa demonstração de justiça célere e eficaz. E não forma somente os conflitos, pois na jurisdição voluntária são realizados registros de nascimento tardios, casamentos e confecção de títulos eleitorais.
O Núcleo da Defensoria Pública da Comarca de Santo Antônio de Leverger verificou inicialmente a distorção decorrente da falta de comparecimento das pessoas necessitadas a sede da comarca para solucionar suas situações jurídicas, o que levou ao estabelecimento de parcerias com o Poder Judiciário, instituições públicas e os municípios ribeirinhos. Assim foi que, em abril de 2006, com apenas 10 dias de efetivo atendimento, o Projeto Ribeirinho Cidadão deu seus primeiros passos e atendia apenas a dez por cento da população carente das comarcas de Santo Antônio de Leverger e do município de Barão de Melgaço.
O Projeto Ribeirinho Cidadão mostrou as necessidades da população, que não era somente de justiça, mas também de informações sobre aposentadoria, expedição de segunda via de documentos de identidade, CPF, Titulo Eleitoral, o que fez agregar o apoio do Governo do Estado de Mato Grosso para possibilitar o atendimento com profissionais de saúde lato sensu, Secretaria de Segurança Pública e Saúde, Ministério da Fazenda.
As dificuldades são vencidas com a boa vontade de todos os parceiros, sendo atendidas cada vez mais pessoas e comunidades ao longo do Rio Cuiabá, estendendo-se agora para o município de Poconé, em outros afluentes, além de trechos pela via terrestre, o que denota ser uma atividade verdadeiramente itinerante de cidadania. Mas não existem dificuldades instransponíveis se todos os parceiros estão imbuídos de dar efetividade a cidadania para aqueles que nunca imaginavam um dia recebe-la na sua própria comunidade.
Mais do que prestar esse serviço à população carente no Projeto Ribeirinho Cidadão como um dever público decorrente do exercício do cargo, é certo que prestá-lo faz com que os profissionais da Defensoria Pública do Estado de Mato Grosso, Tribunal de Justiça, Assembleia Legislativa, Tribunal Regional do Trabalho Ministério Público, Secretárias de Segurança Pública, de Saúde, Meio Ambiente, Banco do Brasil, Prefeitura de Barão de Melgaço, Exército, Imprensa, Médicos, Enfermeiros, bem como a tripulação do barco, onde todos os envolvidos atinjam o bem-estar espiritual trazido com a felicidade de receber um sincero sorriso e um fraterno abraço como verdadeiro pagamento por parte de todo povo Ribeirinho.
Por fim, registro meu apreço e admiração a todos os participantes do Projeto Ribeirinho Cidadão VII, que deixaram seus familiares para dedicar seu tempo aos menos favorecidos, com muita garra, dedicação, união e força de vontade em ajudar o próximo.
Joaquim José Abinader Guedes da Silva
Defensor Público de Entrância Especial