Drogas:Um mal que nem o amor consegue vencer
Por Diário de Cuiabá
22/07/2012 - 12:02
Foto: Lorival Fernandes/DC
“Deus, traz a minha mãe aqui para deitar comigo. Eu queria muito dormir com ela”. O apelo é da pequena Ana Beatriz, que só tem cinco anos, não sabe nada sobre drogas, mas compartilha com a mãe, os quatro irmãos, avós e tios um drama cruel imposto pela dependência da pasta-base.
Tamanha é a saudade que a menina chega a adormecer abraçada a uma foto da mãe. Dona Francisca Maria Fernandes, 53 anos, a avó, diz que a neta vai além: faz carinho, põe a foto ao seu lado e a cobre com o mesmo cobertor que está usando. “Hoje vou dormir com minha mãe”, sonha.
Ana Beatriz, que apreendeu a rezar indo à igreja com a avó, evangélica, faz o apelo todas as noites. E reclama: “minha mãe vem, mas logo volta”, como se estivesse se queixando de Deus por não atendê-la integralmente.
A mãe de Ana Beatriz, Kedma Fernandes, 32 anos, é dependente de drogas, está grávida do sexto filho morando nas ruas de Cuiabá, onde se alimenta de restos ou de refeições doadas. Ela não sabe o tempo da gestação porque não faz o pré-natal, acompanhamento médico considerado fundamental durante a geração de um filho. Sabe quem é o pai, um usuário como ela, e acha que pode estar de 4, 5 ou 6 meses de gravidez.
Nos últimos dias, Kedma tem dormido no mato, à margem do Rio Cuiabá, próximo do Atacadão do Porto, uma área que serve de abrigo para dezenas de usuários de drogas. Nesse local, as únicas visitas que os dependentes químicos recebem são de policiais, sempre para expulsá-los.
Kedma, que já tem uma filha de 15 anos e fugiu de casa deixando ela e outros três filhos, inclusive o caçula, um menino de 1 ano e meio, aos cuidados da mãe e da irmã, confessa que está nas ruas não por falta de apoio e carinho família, mas por se sentir incapaz de abandonar a pasta-base.
Sabe que os pais e os filhos estão prontos para recebê-la, tem certeza do amor que sente pelos filhos e da reciprocidade desse sentimento, mas conta que não consegue se afastar da droga e permanecer com as crianças.
“Minha filha pode voltar a hora que quiser que as portas estarão abertas e a receberemos com carinho”, diz dona Francisca. Sem notícias há mais de 30 dias, ela ficou feliz ao saber que Kedma está viva e aparentando boas condições de saúde.
A informação chegou à dona Francisca pela reportagem do Diário, que esta semana encontrou Kedma dormindo na margem do rio. “Liga para minha mãe”, pediu ela, fornecendo o número do telefone e o endereço. A reação de dona Francisca não poderia ser outra: muitas perguntas, entre lágrimas, em única frase. “Vocês estiveram com minha filha mesmo, onde, como ela está...?
Poucas horas depois ela recebeu a equipe do Diário em casa, no bairro Maringá I, em Várzea Grande. Mãe e filha estão separadas por uma distância curta, menos de 3 quilômetros, mas vivem em mundos completamente diferentes. Dona Francisca não conhece drogas, enquanto a filha já experimentou praticamente todas, desde maconha, passando por cocaína até chegar na pasta-base.
“Não sei mais o que fazer, parece que ninguém pode nos ajudar. Minha única esperança é Deus, meu Senhor, por quem tenho orado e ajoelhado pedindo por minha filha”, desabafa a mãe.