Índios: aprovada lei que proíbe o infanticídio
Por Joanice de Deus/Diário de Cuiabá
28/08/2015 - 06:24
índios de diversas etnias acompanharam a votação
Mato Grosso conta uma população de aproximadamente 44 mil índios de 42 etnias diferentes. Ainda hoje, alguns desses povos mantêm práticas tradicionais, como o infanticídio, o assassinato de crianças com deficiência ou albinas, entre outras. Um exemplo são os Kamayurás, que vivem no interior do Parque Indígena do Xingu e vêm sendo investigados pelo Ministério Público Federal (MPF), que em julho passado abriu inquérito para apurar denúncias de matança de crianças indígenas pela etnia.
Para muitos, costumes como estes são vistos como “ato cultural ou tradicional”. Porém, o Projeto de Lei 1057/07, aprovado no último dia 26, na Câmara dos Deputados, quer combater essas práticas entre as sociedades indígenas e garantir a proteção dos direitos fundamentais de crianças, adolescentes, mulheres e idosos vulneráveis nas comunidades.
Apelidada de “Lei Muwaji”, a proposta de autoria do deputado Marcos Rogério (PDT-RO) seguirá para o Senado. A denominação “Lei Muwaji” é uma homenagem a uma mãe da tribo dos suruwahas (que vivem no Sudoeste do Amazonas). Ela se rebelou contra a tradição de sua tribo e salvou a vida da filha, que seria morta por ter nascido deficiente.
O entendimento do deputado é de que o Estado brasileiro não deve deixar os indígenas sozinhos quando se trata de defender as crianças que possam ser vítimas de práticas tradicionais ultrapassadas. “Direitos humanos são para todos, independentemente de sua cultura, que não pode violar o direito fundamental da vida”, afirmou Marcos Rogério, por meio da Agência de Notícias da Câmara dos Deputados.
Do Conselho Indigenista Missionário de Mato Grosso (Cimi/MT), Maria de Lourdes Araújo Duarte entende que a proposta mexe com a autonomia e a cultura indígena. “Não sou a favor de qualquer tipo de violência, mas há certa pressão sobre esses povos. Acredito que o ser humano com educação e espiritualidade possa evoluir no sentido de eliminar práticas de violência existentes em todo tipo de sociedade”, disse.
Maria de Lourdes diz que em algumas aldeias já existe todo um processo de mudança e acredita que avanços podem ser conquistados com projetos em setores como a saúde e educação. “É um processo evolutivo e à medida que os indígenas vão adquirindo a capacidade de reflexão, educação, empoderamento, e, vivendo melhor, essas modificações vão acontecendo”, disse, comentando que já viveu em uma aldeia (o nome e a localização não foram informados) em que muitos comiam carne de cadáver humano e hoje, segundo ela, há todo um processo de mudança em relação à prática.
De acordo com o projeto, “os órgãos responsáveis pela política indigenista, como a Fundação Nacional do Índio (Funai), deverão usar de todos os meios para proteger crianças, adolescentes, mulheres, pessoas com deficiência e idosos indígenas de práticas que atentem contra a vida, a saúde e a integridade físico-psíquica”. Entre essas práticas, o texto lista infanticídio ou homicídio, abuso sexual ou estupro individual ou coletivo, escravidão, tortura, abandono de vulneráveis e violência doméstica.
Também deverão desenvolver programas e projetos para a defesa de recém-nascidos, crianças ou adolescentes, mulheres e idosos, além de um cadastro de gestante por etnia e/ou aldeia com a finalidade de proporcionar acompanhamento e proteção durante a gestação.
Já as ouvidorias dos órgãos indigenistas serão responsáveis pelo recebimento das notificações e comunicados das situações listadas no projeto que sejam contra a vida e a saúde das pessoas vulneráveis.
A reportagem do Diário tentou falar sobre o assunto com coordenador regional da Funai, Benedito Garcia, mas não obteve êxito.